29 de December de 2016
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. HERDEIRO TESTAMENTÁRIO. PLANO DE PARTILHA.
Tendo o herdeiro testamentário falecido depois da abertura da sucessão, e já tendo havido aceitação tácita da parte dele, não há embasamento jurídico para concluir que, com a morte dele, o que lhe foi deixado em testamento tenha retornado ao monte-mor.
Porque se o herdeiro testamentário faleceu depois da abertura da sucessão, então o que ele recebeu em testamento, apesar da falta de transferência formal, já havia ingressado no patrimônio dele.
Ademais, ainda que aceitação tácita do herdeiro testamentário não tivesse ocorrido quando ele ainda estava vivo, quando o herdeiro falece sem declarar se aceita ou não a herança, tal poder passa para os sucessores dele (art. 1.809, do CCB).
No caso, os sucessores do herdeiro testamentário falecido são os agravantes, que há anos já aceitaram, e já praticaram e vem praticando diversos atos que denotam aceitação (foram inclusive eles quem apresentaram plano de partilha).
Hipótese na qual o plano de partilha deve prever o pagamento ao herdeiro testamentário já falecido.
DERAM PROVIMENTO.
Agravo de Instrumento
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Oitava Câmara Cível |
Nº 70071473136 (Nº CNJ: 0357507-74.2016.8.21.7000)
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Comarca de Alvorada |
SUCESSAO DE SADI VIEGAS DOS SANTOS
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AGRAVANTE |
BRUNA CASTILHOS DOS SANTOS
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AGRAVANTE |
AUGUSTA MARIA DA COSTA
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AGRAVANTE |
JULIO CESAR DOS SANTOS GOULART
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AGRAVANTE |
ALVARO LUIS DOS SANTOS GOULART
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AGRAVANTE |
NAIR SANTOS DOS SANTOS
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AGRAVANTE |
TEREZINHA DOS SANTOS AGUIAR
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AGRAVANTE |
MOYSES VIEGAS DOS SANTOS
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AGRAVADO |
JUSSARA DOS SANTOS FEIJO
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AGRAVADO |
DIOLINDA MARIA DOS SANTOS FRAGA
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AGRAVADO |
ESPOLIO DE FLAVIO VIEGAS MOROZ
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AGRAVADO |
ESPOLIO DE MARIA HORTENCIA VIEGAS DSO SANTOS
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AGRAVADO |
CERLI SANTOS DOS SANTOS
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INTERESSADO |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao agravo de instrumento.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores
Des. Luiz Felipe Brasil Santos e Des. Ricardo Moreira Lins Pastl.
Porto Alegre, 15 de dezembro de 2016.
DES. RUI PORTANOVA,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Inicialmente, adoto o relatório contido no parecer ministerial:
“Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Sucessão de Sadi Viegas dos Santos, inconformada com decisão proferida nos autos do inventário dos bens deixados por Flávio Viegas Moroz, que homologou o plano de partilha apresentado pela atual inventariante, Cora Ribeiro Moroz.
Eis o teor da decisão agravada:
Vistos etc.
O plano de partilha apresentado pela herdeira testamentária Cora está correto. Acontece que o outro herdeiro testamentário Sadi faleceu antes mesmo de aceitar e habilitar-se no presente feito, razão pela qual o montante equivalente a 25% que caberia a ele volta ao monte-mor, conforme despacho da fl. 118, ficando, assim, 75% à herdeira necessária, já falecida, Maria Hortência Viegas dos Santos. Considerando o interesse de venda do bem imóvel, intime-se a inventariante para que junte aos autos a proposta de compra do bem, com o seu respectivo valor, bem como o esboço de divisão do montante, e também para que esclareça as despesas mencionadas na petição retro. Deverá, ainda, esclarecer se há dívidas de IPTU. Havendo concordância dos herdeiros habilitados, será deferido o pedido de alvará para a venda e posterior divisão dos valores.
Intimem-se.
Em suas razões, aduz que o inventário foi aberto em razão do testamento deixado por Flávio, no qual constaram como herdeiros Sadi Viegas dos Santos e Cora Ribeiro Moros. Explica que diante do óbito de Sadi – já no curso do inventário – permaneceram como partes os herdeiros de Maria Hortência (mãe de Flávio), que já estão habilitados, os herdeiros de Sadi e Cora. Diz ter apresentado o plano de partilha contemplando Maria Hortencia com 50% do patrimônio deixado, 25% para Sadi e 25% para Cora, com o que não concordou a agravada Cora, ao argumento de que caberia 75% à Maria Hortência e os outros 25% a ela. Embora o juízo da origem tenha acolhido a inconformidade de Cora, garante que Sadi se habitara no inventário em julho de 2004, portanto, antes do seu óbito e do de sua mãe. Alega que após o referido despacho de fl. 118, que se deu no ano de 2007, o inventário não teve regular prosseguimento, colacionando a movimentação processual e sustentando que até o presente momento não houve a devida intimação acerca do seu conteúdo. Esclarece não haver discordância com a alienação e partilha do imóvel de propriedade do espólio, cingindo-se a irresignação à forma da distribuição patrimonial, uma vez que Sadi se habilitou no inventário. Requer o provimento do recurso para que seja considerada a intimação do dia 27 de setembro do corrente ano para o início da contagem do prazo recursal e para que seja reformada a decisão agravada, fazendo constar como correta a partilha nos termos expostos (fls. 04/17).
O recurso foi recebido com efeito suspensivo (fls. 93/96) e foram prestadas informações pelo juízo da origem (fl. 102), vieram os autos com vista.”
O Ministério Público opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTOS
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Antes de mais, cumpre destacar, embora isso não seja sequer alvo ou objeto de questionamento, que o presente recurso, apesar do tempo transcorrido, não tem óbice algum ao seu conhecimento, porquanto só agora os agravantes foram intimados.
Sobre isso bem referiu o agente ministerial:
O recurso é tempestivo e formalmente bem instruído, hábil para conhecimento.
Insta esclarecer, inicialmente, que da leitura da decisão hostilizada, verifica-se que a forma de partilha dos bens apresentada no plano de partilha pela atual inventariante deu-se nos exatos termos da determinação do juízo, em sua referida “decisão de fl. 118”.
E tal decisão foi prolatada em 2007, sendo publicada em nota de expediente, não tendo havido recurso.
Entretanto, daquela não foram intimados os sucessores de Sadi, ora agravantes, como se pode verificar da simples leitura da nota de expediente. Por conseguinte, contra eles não produziu efeitos.
Quanto ao mérito, já adianto que o agravo merece provimento, na linha do despacho liminar, nos seguintes termos:
Vistos etc.
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida nos autos do inventário dos bens deixados em razão do falecimento de FLAVIO, que considerou equivocado o plano de partilha apresentado pelos agravantes.
A parte agravante entende que a partilha deve ser feita da seguinte forma: 50% para a herdeira necessária MARIA HORTÊNCIA; 25% para a herdeira CORA e 25% para os sucessores do herdeiro SADI.
Vale destacar, CORA e SADI são herdeiros testamentários.
E SADI já faleceu.
Mas atenção: SADI faleceu depois da abertura da sucessão de FLAVIO; aliás, SADI faleceu já depois de aberto o inventário.
O juiz de origem indeferiu o plano de partilha apresentado, por considerar que o herdeiro testamentário SADI teria falecido antes de ser citado, de ter aceitado a herança ou de ter se habilitado no processo, razão pela qual considerou que sua parte teria voltado ao monte-mor.
Assim, segundo o juiz de origem, a partilha ficaria em 75% para a herdeira necessária MARIA HORTÊNCIA, e 25% para a herdeira testamentária CORA.
Ainda que seja na ordem da cautela, a decisão comporta reparos.
Em primeiro lugar, está no instrumento a cópia de uma petição atravessada por MARIA HORTÊNCIA, ainda em SETEMBRO/2004, postulando o prosseguimento do feito com a maior brevidade possível, tendo em vista que SADI estava hospitalizado (fl. 83).
Ou seja, na ocasião SADI ainda estava vivo.
E o teor da petição supracitada, apesar de não ter sido atravessada pelo próprio SADI, pode perfeitamente ser considerada como prova de que houve aceitação tácita por parte dele, enquanto ainda estava vivo. E aceitação tácita, não olvido, vale como aceitação plena (CCB, art. 1.805).
Mais.
Ainda que não houvesse aceitação tácita de SADI enquanto ele ainda estava vivo, mas sendo inequívoco que SADI faleceu depois de aberta a sucessão de FLAVIO, depois inclusive de ter sido aberto o inventário, então o caso atrai a incidência e aplicação da regra insculpida no art. 1.809, do CCB, que tem o seguinte teor:
Art. 1.809. Falecendo o herdeiro antes de declarar se aceita a herança, o poder de aceitar passa-lhe aos herdeiros, a menos que se trate de vocação adstrita a uma condição suspensiva, ainda não verificada.
Isso é regra contida no Título I do Livro V do CCB, denominado “Da Sucessão Em Geral”. De forma que é regra que se aplica tanto à sucessão legítima, quanto à sucessão testamentária.
E no presente caso, não há condição suspensiva aposta no testamento para o fim de implementar a vocação hereditária testamentária de SADI.
Por isso, falecendo um herdeiro (necessário ou testamentário) antes de declarar se aceita ou não a herança, o poder de aceitar passa aos sucessores dele.
No caso, os sucessores de SADI são os agravantes.
E os agravantes há muito já praticaram atos próprios de herdeiro, que denotam irrefutável e inafastável ocorrência de aceitação da herança por parte deles.
Tanto é assim, que são os sucessores de SADI que apresentaram plano de partilha; e são os sucessores de SADI que estão, aqui e agora, recorrendo contra decisão que considerou que eles não teriam nada a receber quando da partilha.
O agente ministerial opinou no mesmo sentido:
Cuida-se de ação de inventário dos bens deixados por Flávio Viegas dos Santos, falecido em 18 de janeiro de 2004.
O de cujus, que tinha apenas sua mãe – Maria Hortência Viegas dos Santos - como herdeira necessária. Assim sendo, deixou testamento público, em que dispôs da metade de seus bens a seu irmão, Sadi Viegas dos Santos e à sua afilhada, Cora Ribeiro Moroz (fls. 80/1).
Sadi Viegas dos Santos veio a óbito em 07 de outubro de 2004 (atestado de óbito a fl. 84).
Maria Hortência Viegas dos Santos foi inicialmente nomeada inventariante, também vindo a óbito no curso do feito, em 05 de dezembro de 2005. Seus herdeiros estão devidamente habilitados.
A inventariança foi, então, passada para um dativo e, posteriormente, à herdeira testamentária Cora, que firmou o respectivo termo de compromisso em 14 de junho de 2006 (fls. 86/87).
O único bem a ser inventariado consiste em um imóvel situado no município de Alvorada, matriculado sob o nº 37.051 do Registro de Imóveis local.
O plano de partilha apresentado pela inventariante sugere a seguinte divisão patrimonial: 75% para a herdeira Maria Hortência Viegas e 25% para a herdeira Cora Ribeiro Moroz (fls. 54/56).
O juízo a quo entendeu por bem homologar o esboço apresentado, salientando que o falecimento de Sadi se deu antes de o mesmo ser citado no presente feito e de aceitar o que lhe caberia segundo o testamento.
Esta é a decisão recorrida e que merece reparos.
Nos termos do artigo 1.798 do Código Civil, legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.
Logo, quando do óbito do herdeiro testamentário Sadi, ocorrido em 07 de outubro de 2004, ou seja, após o falecimento do testador, o legado já havia já havia ingressado em seu patrimônio.
Por conseguinte, tem-se que Sadi recebeu em vida o que lhe fora deixado por Flavio, independentemente de aceitação expressa da herança. Na mesma trilha, o artigo 1.809 do Código Civil
[1] dispõe que em não havendo condição suspensiva, se falecer o herdeiro antes de dizer se aceita a herança, o ato passa aos seus herdeiros.
Não é demais colacionar o ensinamento de Arnaldo Rizzardo
[2] sobre o ponto:
Com a morte da pessoa, a posse e a propriedade de seus bens transferem-se para os herdeiros, como expressamente vem consignado no art. 1.784 do Código Civil (art. 1.572 do Código da Lei nº 3.071). Todas as relações então existentes entre o de cujus e os bens transmitem-se aos herdeiros legítimos e testamentários. A morte é o evento determinante dessa operação, dando causa à abertura da sucessão.
(...)
Posteriormente, no entanto, admissível a recusa do patrimônio, mas por manifestação expressa da vontade. Enquanto não exposta a disposição de não receber, o herdeiro sucedeu nos bens e direitos.
Assim, merece provimento o agravo de instrumento interposto, devendo ser reformada a decisão hostilizada.
ANTE O EXPOSTO, dou provimento ao agravo de instrumento, para o fim de reconhecer o direito hereditário do herdeiro testamentário, e determinar seja o plano de partilha elaborado na conformidade com tal direito, tudo nos moldes da fundamentação retro.
Des. Luiz Felipe Brasil Santos - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Ricardo Moreira Lins Pastl - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. RUI PORTANOVA - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70071473136, Comarca de Alvorada: "DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: EVELISE LEITE PANCARO DA SILVA
[1] Art. 1.809. Falecendo o herdeiro antes de declarar se aceita a herança, o poder de aceitar passa-lhe aos herdeiros, a menos que se trate de vocação adstrita a uma condição suspensiva, ainda não verificada.
[2] In Direito das Sucessões. 6.ed.Rio de Janeiro: Foresnse, 2011. p. 61.
Disponível no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
http://www.tjrs.jus.br/busca/search?q=INVENT%C3%81RIO+COM+TESTAMENTO&proxystylesheet=tjrs_index&client=tjrs_index&filter=0&getfields=*&aba=juris&entsp=a__politica-site&wc=200&wc_mc=1&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&sort=date%3AD%3AR%3Ad1&as_qj=INVENT%C3%81RIO+COM+TESTAMENTO&site=ementario&as_epq=&as_oq=&as_eq=&as_q=+#main_res_juris