11 de June de 2015
APELAÇÃO CÍVEL. REGISTRO DE IMÓVEIS. RETIFICAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA. CESSÃO DE DIREITO HEREDITÁRIOS. AUSÊNCIA DE DOAÇÃO DOS DIREITOS SOBRE A HERANÇA. IMPOSSIBILIDADE EM PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA DE RETIFICAÇÃO. NECESSIDADE DE DOAÇÃO.

 

Nos autos do procedimento verifica-se que não se trata de mera retificação de erro no registro, mas sim de ausência de doação dos direitos hereditários de Eugênio Luiz Nunes e do falecido José Carlos Nunes, que não pode ser realizado por procedimento de jurisdição voluntária. Inteligência do art. 214 da Lei 6.015/73.

APELO DESPROVIDO.

Apelação Cível

 Décima Sétima Câmara Cível Nº 70063878243 (N° CNJ: 0073202-78.2015.8.21.7000)

 Comarca de São Leopoldo DAIANA CILENE DA SILVEIRA

 APELANTE MARIA IVONE NUNES DA SILVEIRA

 APELANTE A JUSTICA

 APELADO ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Liége Puricelli Pires e Des. Giovanni Conti.

Porto Alegre, 28 de maio de 2015.

DES. GELSON ROLIM STOCKER,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Gelson Rolim Stocker (RELATOR)

Trata-se de recurso de apelação interposto por DAIANA CILENE DA SILVEIRA E MARIA IVONE NUNES DA SILVEIRA, nos autos da ação de retificação de escritura pública, inconformada com o julgamento de extinção da ação.

Adoto o relatório da sentença (fls. 74-75v):

Trata-se de ação de retificação de escritura pública na qual a parte autora postula a expedição de alvará de doação do quinhão que pertence a José Carlos Nunes e pedido de manifestação para que Eugenio Luiz Nunes se manifeste sobre a doação de sua parte.

Após inúmeros atos processuais relativos a tentativa de citação de Eugênio Luiz, vieram os autos conclusos.

Relatado sucintamente.

E a sentença assim decidiu em sua parte dispositiva:

Assim sendo, outra alternativa não resta senão a extinção do presente, sem julgamento de mérito pela falta de interesse de agir, na forma do artigo 267, inciso VI do CPC porque o instrumento processual escolhido não é adequado para obtenção da bem da vida pretendido.

Nas razões recursais da autora (fls. 77-80) sustenta a necessidade de revogar a sentença e determinar o prosseguimento do processo. Aponta a existência de documento que comprove que três dos quatro herdeiros do casal resolveram ceder sues direitos hereditários à apelante. Aduz que a jurisprudência tem decidido pela possibilidade de correção dos registros por determinação judicial. Postula provimento do apelo.

O Ministério Público Estadual, através do E. Procurador de Justiça Armando Antônio Lotti, emitiu parecer nas fls. 82-83v no sentido de conhecer e desprover o apelo da autora.

Dispensada de preparo, por litigar sob o pálio da assistência judiciária gratuita, vieram os autos conclusos para estar Corte de Jurisdição.

Registro que foi observado o disposto nos art. 549, 551 e 552 do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTOS

Des. Gelson Rolim Stocker (RELATOR)

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Compulsando os autos verifico que a parte autora pretende a retificação de registro de imóvel para que seja considerada a cessão de direitos hereditários dos direitos advindos do falecimento de Lady Vieira Nunes e a doação da fração ideal do de cujus Eugênio Nunes pertencente à Maria Ivone Nunes e Eugênio Luiz Nunes, com expedição de alvará de doação do quinhão de doação do quinhão do de cujus José Carlos Nunes.

Ocorre que não há como em procedimento de jurisdição hereditária requerer o reconhecimento de doação dos herdeiros Eugênio Luiz Nunes e José Carlos Nunes, sendo que este último já me falecido e seus eventuais herdeiros é que deveriam dispor do bem e os quais não podem ser prejudicados.

Nos termos do previsto no art. 214 da Lei nº6.015/73 não há falar em retificação do registro caso prejudique terceiros, senão vejamos:

  Art. 214. A requerimento do interessado, poderá ser retificado o erro constante do registro, desde que tal retificação não acarrete prejuízo a terceiro.

E esse é o caso dos autos, sendo, portanto, correta a sentença de improcedência, haja vista que não se trata de mero erro de escritura, mas sim de necessidade de efetivação de escritura de doação.

Aliás, nesse sentido o bem lançado parecer ministerial, que também adoto como razões de decidir de fls. 82-83v redigido pelo Procurador de Justiça Dr. Armando Antônio Lotti, in verbis:

Ao exame da matéria devolvida nas razões recursais. Não é caso de provimento. Segundo a inicial, a autora Daiana foi agraciada com a cessão dos direitos hereditários pertencentes a sua mãe, ora também recorrente, e aos tios Eugênio Luiz Nunes e Luiz Carlos Nunes (fls. 20 e 23), relativamente à herança deixada por Eugênio Nunes e Lady Vieira Nunes, composta pelo imóvel descrito na matrícula das fls. 16/17. A alegação é de erro material nas referidas escrituras públicas de cessão, uma vez que a herança deixada por Eugênio Nunes foi objeto de inventário, ainda no ano de 1979, cujos formais de partilha, em nome dos herdeiros cessionários, foram registrados na referida matrícula. Consta, ainda, na inicial, que o cessionário Eugênio Luiz Nunes re-ratificou a escritura de cessão de direitos hereditários de seu quinhão, através do documento da fl. 18, restringindo-a ao quinhão relativo à herança deixada por Lady Vieira Nunes. Quanto à parte ideal do imóvel pertencente ao herdeiro Eugênio Luiz Nunes, relativa à herança deixada por Eugênio Nunes, as autoras postulam seja esse herdeiro citado para se manifestar acerca da doação dessa parte do imóvel, bem como requerem a expedição de alvará de autorização de doação da parte do imóvel pertencente a José Carlos Nunes e Maria Ivone Nunes, parte essa também havida da herança deixada por Eugênio Nunes.

Ora, não obstante a vontade dos herdeiros em questão em ceder à autora Daiane seus respectivos quinhões advindos da herança deixada por Eugênio, expressa nas escrituras públicas de cessão das fls. 20 e 23, entendo que a pretensão da autora Daiana, de exigir a doação desse mesmo patrimônio, não pode ser obtida em sede de jurisdição voluntária. E isso porque se Eugênio Luiz Nunes pretendesse a doação a teria providenciado por ocasião da re-ratificação da escritura pública de cessão de direitos hereditários constante à fl. 20, através daquela da fl. 18, na qual fez referência estar cedendo os direitos hereditários havidos por morte de Ledy  Nunes. Quanto ao herdeiro José Carlos Nunes, igualmente, embora não se tenha notícia de eventual re-ratificação da escritura pública de cessão por ele firmada, tal como fez Eugênio Luiz, não há como se valer do procedimento de jurisdição voluntária para obter a doação. Acrescente-se que José Carlos é falecido e não há como determinar a seus herdeiros a obrigação de doar.

Como bem apontado na sentença, “inexiste possibilidade de comando judicial para obrigar a doação, tampouco de suprir os efeitos de escritura pública. Se a cessão de direitos hereditários juntada nos autos não pode surtir seus efeitos na íntegra porque metade do objeto não era mais ‘direitos hereditários, mas sim propriedade’, o remédio correto não é a retificação, mas sim a efetivação de escritura pública de doação.”

Consigne-se, ainda, que, quanto ao cessionário José Carlos, falecido no ano de 2007, o atestado de óbito da fl. 30 denota que o “de cujus” deixou uma herdeira menor – Gabriela. Nessa linha, qualquer pretensão de disposição dos bens deixados por José Carlos, obrigatoriamente, enquanto a herdeira for menor, dependerá de autorização judicial e, induvidosamente, como apontado na decisão, “quem deve tomar a iniciativa de tal procedimento é a doadora e não a donatária.”

Em resumo, se há erro na escritura pública de cessão de direitos hereditários já realizada, a retificação não deve abarcar a doação pretendida pelas autoras, uma vez que essa demanda a confecção de instrumento público próprio, cuja autorização não pode ser obtida em procedimento de jurisdição voluntária. Aqui, nos termos da sentença “somente teria guarida o procedimento voluntário em questão se provada a necessidade de conserto de erro de escritura e não para suprir um instrumento público não realizado.” Assim, nenhum retoque ao decreto de extinção do feito.

Por tais razões, não merece reforma a sentença.

DISPOSITIVO.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo.

É o voto.

Des.ª Liége Puricelli Pires (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Giovanni Conti - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. GELSON ROLIM STOCKER - Presidente - Apelação Cível nº 70063878243, Comarca de São Leopoldo: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO."

Julgador(a) de 1º Grau: DANIELA AZEVEDO HAMPE

Disponível no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

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