Em
entrevista à Anoreg/BR, o juiz federal Valter Shuenquener de Araújo,
secretário-geral do CNJ apresentou ações da nova gestão do Conselho e analisou
a implementação da LGPD no setor extrajudicial
A nova gestão do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), para o biênio 2020-2022, tomou posse no dia 10 de setembro, com
apresentação do escopo de trabalho em torno dos temas de proteção aos direitos
humanos e ao meio ambiente, garantia da segurança jurídica, combate à corrupção
e incentivo à digitalização do acesso ao Judiciário.
Uma semana após o início do mandato,
entrou em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), tema que norteou a
entrevista da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR) com
o novo secretário-geral do CNJ, juiz federal Valter Shuenquener de Araújo, uma
vez que a normativa traz reflexos diretos à atividade de notários e
registradores.
Doutor pela Faculdade de Direito da
Universidade Ruprecht-Karls de Heidelberg, na Alemanha, o magistrado já atuou
como advogado da Petrobras S/A, procurador federal, no Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), e procurador do Estado do Rio de Janeiro. Em duas
ocasiões prévias, no período de 2011 a 2015, atuou junto ao gabinete do
ministro Luiz Fux no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). Nos últimos cinco anos, antes de assumir o cargo no CNJ, era
conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por indicação do
STF.
Leia a íntegra da entrevista:
Anoreg/BR – Quais
serão as primeiras ações da nova gestão do Conselho Nacional de Justiça para o
setor extrajudicial?
Valter Shuenquener
de Araújo – A normal legal de proteção de dados, em que pese ter sido
promulgada em 2018, entrou em vigor em agosto do corrente ano. Nesse cenário,
as impactantes novidades advindas da LGPD ainda carecem de minúcias quanto a
seu adequado tratamento. Nota-se que a norma elencou uma série de princípios e
obrigações direcionadas aos agentes de tratamento e, mormente, aos agentes
delegados dos serviços notariais e registrais. Como exemplos: garantir-se aos
titulares dos dados o regular exercício de todos os direitos previstos na lei
(portabilidade, confirmação do tratamento, cópias etc); a garantia de que o
acesso aos dados será conferido apenas aos colaboradores que devam ter acesso;
a adequação das hipóteses legais de tratamento dos dados; a segurança dos dados
pessoais dos usuários durante todo o ciclo de vida e; a conscientização e
treinamento dos colaboradores no tratamento dos dados pessoais. Dessa forma,
compreendo que a postura inicial do Conselho Nacional de Justiça em relação aos
serviços cartoriais, em face, mormente, das inovações provindas da lei, deve
focar nesses pontos tendo, como vetor incipiente, a capacitação e
conscientização dos operadores do tratamento de dados pessoais. Para tanto, sem
se descurar, absolutamente, da eficiência já demonstrada pelos serviços
notariais e registrais nos últimos anos, na medida do que se fizer necessário,
o Conselho se valerá dos instrumentos normativos em prol do auxílio à
qualificação dos agentes de tratamento de dados pessoais. Faço questão de
reforçar, nesse ponto específico, que passa ao largo de qualquer intenção do
órgão a pretensão de emitir prescrições aos notários e registradores. O
objetivo deve ser percebido como o de colaboração e de cooperação sinergéticos,
em que haja um intercâmbio que, a médio prazo, traga benefício para os dois
lados, para o CNJ e para os cartórios.
Anoreg/BR – Neste
mês, o CNJ firmou uma parceria com a Escola Nacional de Notários e
Registradores (ENNOR) para o desenvolvimento de pesquisas e estudos no setor
extrajudicial. Qual sua visão sobre esse acordo e qual a expectativa do CNJ?
Valter Shuenquener
de Araújo – Essa parceria tem o simbolismo de ter sido uma das
medidas iniciais adotadas pela gestão do ministro Luiz Fux no Conselho Nacional
de Justiça. Assim, principalmente pelos frutos que dela podem advir, pode-se
dizer, seguramente, que o desejo é que essa parceria seja um dos marcos dessa
gestão. As atividades notariais e registrais vêm ganhando amplo destaque no
âmbito jurídico nacional pelo viés crescente de composição e de conciliação
extrajudiciais que, evidentemente, traz benesses inestimáveis ao Poder
Judiciário, na medida em que, de modo adrede, previne litígios judiciais em um
sistema atualmente abarrotado. Desse modo, uma das expectativas do acordo se
funda em uma forma de intercâmbio entre o Poder Judiciário nacional e os
agentes operadores dos serviços notariais e registrais, por meio de estudos que
permitam um mais amplo e profícuo conhecimento das ferramentas que ambos os
acordantes possam oferecer um ao outro. Tenho certeza de que, nesse espírito,
para além dos benefícios que serão auferidos por ambos os parceiros, a maior
vantagem reverterá em favor da própria sociedade, através de uma nova forma de
Direito, que inevitavelmente deve ser explorada. Para arremate, deve ser
registrado que, sem sombras de dúvidas, a LGPD é outro ponto que estará
inserido nessa parceria estabelecida.
Anoreg/BR – Como o
senhor avalia o impacto inicial da LGPD no setor extrajudicial?
Valter Shuenquener
de Araújo – O impacto inicial reside justamente na necessidade de
qualificação e de interação dos agentes delegados e de seus colaboradores em
relação às prescrições da LGPD. Havendo essa clarificação, certamente serão
minimizados e eliminados os eventuais efeitos danosos, na interpretação da lei,
às atividades notariais e registrais. Detidamente em relação à indagação, a
repercussão inicial, para os cartórios, em forma de amostragem, consiste nas
necessidades de prevenção contra incidentes envolvendo dados pessoais, de
conscientização de privacidade e de proteção de dados pessoais, de diagnóstico
das lacunas a surgirem em virtude da novel lei, de desenvolvimento de novos
modelos de procedimentos que sejam adequados aos novos preceitos, dentre outras
necessidades.
Anoreg/BR – Com a
vigência da LGPD, como será a atuação do CNJ para a regulamentação da atividade
notarial e registral?
Valter Shuenquener
de Araújo – O notário e o registrador, no clássico e milenar
desempenho de suas nobres funções, são agentes privilegiados no acesso e no
tratamento de dados pessoais dos usuários dos serviços cartorários, de forma
ampla. Em outro sentido, é inegavelmente sabido que o escopo primacial da
atividade cartorária é assegurar a segurança e a conservação dos atos jurídicos
praticados, dada a fé pública, de rigor, conferida aos agentes delegados. Nesse
prisma, vislumbro um interessante ponto de confluência entre a LGPD e as
atividades notarial e registral. Em outras linhas, por meio de reflexões
prévias, conclui-se que a LGPD se traduz em norma legal que vai ao encontro dos
principais desígnios da atuação cartorária, quais sejam, a segurança jurídica e
a conservação dos atos jurídicos. Sendo assim, penso que, mais do que
regulamentar as atividades notariais e registrais, é relevante para o Conselho
Nacional de Justiça ter os notários e registradores como aliados e parceiros no
cumprimento da tarefa de proteger os direitos fundamentais de liberdade e
privacidade dos indivíduos, nos termos do que preconiza a Lei nº 13.709/2018.
Anoreg/BR – Como o
CNJ prevê a padronização de normativas para os cartórios nos próximos meses?
Valter Shuenquener
de Araújo – O alinhamento dos cartórios brasileiros com as
prescrições da LGPD é uma das preocupações do Conselho Nacional de Justiça.
Como aliado nessa missão, o órgão tem a boa sorte de contar com os próprios
notários e registradores. O princípio da prudência registral e notarial,
basilar nas respectivas atividades, confere aos profissionais delegados
capacidade aproximada à dos magistrados, ou seja, a eles incumbe exprimir e
interpretar o direito dentro de sua esfera de competência. Nesse rumo,
certamente é ímpar e indispensável o aporte dos notários e registradores para o
completo ajustamento à LGPD. No que diz respeito à edição de provimentos, faço
questão de robustecer que o propósito do CNJ é o de contar, inclusive, com a
colaboração dos agentes delegados notariais e registrais na produção dessas
normativas, o que, por exemplo, se afigurará pertinente nos trabalhos a serem
entabulados a partir do recente termo de parceria já firmado e ao qual me
referi anteriormente. Enfim, temos a consciência inequívoca de que os
provimentos do CNJ, existentes e que eventualmente venham a ser criados, devem
ser enfrentados sob uma ótica de coalizão, para o constante aperfeiçoamento das
visões do Conselho Nacional de Justiça sobre as atividades notarial e registral
e vice-versa. Nesse esteio, sobretudo, deve-se ter em voga que atos normativos
relacionados à LGPD devem, indissociavelmente, cumprir a finalidade da criação
desta norma legal, que, categoricamente, é a proteção do titular dos dados
pessoais, qual seja, o usuário do serviço público e, no caso específico, do
serviço público delegado.
Em entrevista à
Anoreg/BR, o juiz federal Valter Shuenquener de Araújo, secretário-geral do CNJ
apresentou ações da nova gestão do Conselho e analisou a implementação da LGPD
no setor extrajudicial
A nova gestão do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), para o biênio 2020-2022, tomou posse no dia 10 de setembro, com
apresentação do escopo de trabalho em torno dos temas de proteção aos direitos
humanos e ao meio ambiente, garantia da segurança jurídica, combate à corrupção
e incentivo à digitalização do acesso ao Judiciário.
Uma semana após o início do mandato,
entrou em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), tema que norteou a
entrevista da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR) com
o novo secretário-geral do CNJ, juiz federal Valter Shuenquener de Araújo, uma
vez que a normativa traz reflexos diretos à atividade de notários e
registradores.
Doutor pela Faculdade de Direito da
Universidade Ruprecht-Karls de Heidelberg, na Alemanha, o magistrado já atuou
como advogado da Petrobras S/A, procurador federal, no Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), e procurador do Estado do Rio de Janeiro. Em duas
ocasiões prévias, no período de 2011 a 2015, atuou junto ao gabinete do ministro
Luiz Fux no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal Superior Eleitoral
(TSE). Nos últimos cinco anos, antes de assumir o cargo no CNJ, era conselheiro
do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por indicação do STF.
Leia a íntegra da entrevista:
Anoreg/BR – Quais
serão as primeiras ações da nova gestão do Conselho Nacional de Justiça para o
setor extrajudicial?
Valter Shuenquener
de Araújo – A normal legal de proteção de dados, em que pese ter sido
promulgada em 2018, entrou em vigor em agosto do corrente ano. Nesse cenário,
as impactantes novidades advindas da LGPD ainda carecem de minúcias quanto a
seu adequado tratamento. Nota-se que a norma elencou uma série de princípios e
obrigações direcionadas aos agentes de tratamento e, mormente, aos agentes
delegados dos serviços notariais e registrais. Como exemplos: garantir-se aos
titulares dos dados o regular exercício de todos os direitos previstos na lei
(portabilidade, confirmação do tratamento, cópias etc); a garantia de que o
acesso aos dados será conferido apenas aos colaboradores que devam ter acesso;
a adequação das hipóteses legais de tratamento dos dados; a segurança dos dados
pessoais dos usuários durante todo o ciclo de vida e; a conscientização e
treinamento dos colaboradores no tratamento dos dados pessoais. Dessa forma,
compreendo que a postura inicial do Conselho Nacional de Justiça em relação aos
serviços cartoriais, em face, mormente, das inovações provindas da lei, deve
focar nesses pontos tendo, como vetor incipiente, a capacitação e
conscientização dos operadores do tratamento de dados pessoais. Para tanto, sem
se descurar, absolutamente, da eficiência já demonstrada pelos serviços
notariais e registrais nos últimos anos, na medida do que se fizer necessário,
o Conselho se valerá dos instrumentos normativos em prol do auxílio à
qualificação dos agentes de tratamento de dados pessoais. Faço questão de
reforçar, nesse ponto específico, que passa ao largo de qualquer intenção do
órgão a pretensão de emitir prescrições aos notários e registradores. O
objetivo deve ser percebido como o de colaboração e de cooperação sinergéticos,
em que haja um intercâmbio que, a médio prazo, traga benefício para os dois
lados, para o CNJ e para os cartórios.
Anoreg/BR – Neste
mês, o CNJ firmou uma parceria com a Escola Nacional de Notários e
Registradores (ENNOR) para o desenvolvimento de pesquisas e estudos no setor
extrajudicial. Qual sua visão sobre esse acordo e qual a expectativa do CNJ?
Valter Shuenquener
de Araújo – Essa parceria tem o simbolismo de ter sido uma das
medidas iniciais adotadas pela gestão do ministro Luiz Fux no Conselho Nacional
de Justiça. Assim, principalmente pelos frutos que dela podem advir, pode-se
dizer, seguramente, que o desejo é que essa parceria seja um dos marcos dessa
gestão. As atividades notariais e registrais vêm ganhando amplo destaque no
âmbito jurídico nacional pelo viés crescente de composição e de conciliação
extrajudiciais que, evidentemente, traz benesses inestimáveis ao Poder
Judiciário, na medida em que, de modo adrede, previne litígios judiciais em um
sistema atualmente abarrotado. Desse modo, uma das expectativas do acordo se
funda em uma forma de intercâmbio entre o Poder Judiciário nacional e os
agentes operadores dos serviços notariais e registrais, por meio de estudos que
permitam um mais amplo e profícuo conhecimento das ferramentas que ambos os
acordantes possam oferecer um ao outro. Tenho certeza de que, nesse espírito,
para além dos benefícios que serão auferidos por ambos os parceiros, a maior
vantagem reverterá em favor da própria sociedade, através de uma nova forma de
Direito, que inevitavelmente deve ser explorada. Para arremate, deve ser
registrado que, sem sombras de dúvidas, a LGPD é outro ponto que estará
inserido nessa parceria estabelecida.
Anoreg/BR – Como o
senhor avalia o impacto inicial da LGPD no setor extrajudicial?
Valter Shuenquener
de Araújo – O impacto inicial reside justamente na necessidade de
qualificação e de interação dos agentes delegados e de seus colaboradores em relação
às prescrições da LGPD. Havendo essa clarificação, certamente serão minimizados
e eliminados os eventuais efeitos danosos, na interpretação da lei, às
atividades notariais e registrais. Detidamente em relação à indagação, a
repercussão inicial, para os cartórios, em forma de amostragem, consiste nas
necessidades de prevenção contra incidentes envolvendo dados pessoais, de
conscientização de privacidade e de proteção de dados pessoais, de diagnóstico
das lacunas a surgirem em virtude da novel lei, de desenvolvimento de novos
modelos de procedimentos que sejam adequados aos novos preceitos, dentre outras
necessidades.
Anoreg/BR – Com a
vigência da LGPD, como será a atuação do CNJ para a regulamentação da atividade
notarial e registral?
Valter Shuenquener
de Araújo – O notário e o registrador, no clássico e milenar
desempenho de suas nobres funções, são agentes privilegiados no acesso e no
tratamento de dados pessoais dos usuários dos serviços cartorários, de forma
ampla. Em outro sentido, é inegavelmente sabido que o escopo primacial da
atividade cartorária é assegurar a segurança e a conservação dos atos jurídicos
praticados, dada a fé pública, de rigor, conferida aos agentes delegados. Nesse
prisma, vislumbro um interessante ponto de confluência entre a LGPD e as
atividades notarial e registral. Em outras linhas, por meio de reflexões
prévias, conclui-se que a LGPD se traduz em norma legal que vai ao encontro dos
principais desígnios da atuação cartorária, quais sejam, a segurança jurídica e
a conservação dos atos jurídicos. Sendo assim, penso que, mais do que
regulamentar as atividades notariais e registrais, é relevante para o Conselho
Nacional de Justiça ter os notários e registradores como aliados e parceiros no
cumprimento da tarefa de proteger os direitos fundamentais de liberdade e
privacidade dos indivíduos, nos termos do que preconiza a Lei nº 13.709/2018.
Anoreg/BR – Como o
CNJ prevê a padronização de normativas para os cartórios nos próximos meses?
Valter Shuenquener
de Araújo – O alinhamento dos cartórios brasileiros com as
prescrições da LGPD é uma das preocupações do Conselho Nacional de Justiça.
Como aliado nessa missão, o órgão tem a boa sorte de contar com os próprios
notários e registradores. O princípio da prudência registral e notarial,
basilar nas respectivas atividades, confere aos profissionais delegados
capacidade aproximada à dos magistrados, ou seja, a eles incumbe exprimir e
interpretar o direito dentro de sua esfera de competência. Nesse rumo,
certamente é ímpar e indispensável o aporte dos notários e registradores para o
completo ajustamento à LGPD. No que diz respeito à edição de provimentos, faço
questão de robustecer que o propósito do CNJ é o de contar, inclusive, com a
colaboração dos agentes delegados notariais e registrais na produção dessas
normativas, o que, por exemplo, se afigurará pertinente nos trabalhos a serem
entabulados a partir do recente termo de parceria já firmado e ao qual me
referi anteriormente. Enfim, temos a consciência inequívoca de que os
provimentos do CNJ, existentes e que eventualmente venham a ser criados, devem
ser enfrentados sob uma ótica de coalizão, para o constante aperfeiçoamento das
visões do Conselho Nacional de Justiça sobre as atividades notarial e registral
e vice-versa. Nesse esteio, sobretudo, deve-se ter em voga que atos normativos
relacionados à LGPD devem, indissociavelmente, cumprir a finalidade da criação
desta norma legal, que, categoricamente, é a proteção do titular dos dados
pessoais, qual seja, o usuário do serviço público e, no caso específico, do
serviço público delegado.
Fonte: Anoreg/BR
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias
Disponível em:
https://www.portaldori.com.br/2020/10/29/e-relevante-para-o-cnj-ter-os-notarios-e-registradores-como-aliados-e-parceiros/