Com o
falecimento de um dos cotitulares de conta-corrente conjunta solidária, o saldo
existente deve ser objeto de inventário e partilha entre os herdeiros,
aplicando-se a pena de sonegados ao cotitular que, com dolo ou má-fé, ocultar
valores.
A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou esse entendimento
para determinar que um homem restituísse ao espólio do irmão 50% do saldo
existente na conta que mantinham juntos.
O
recurso teve origem em ação de sonegados ajuizada pelo espólio, na qual
pleiteou a restituição e colação de 50% do saldo bancário existente na conta
conjunta, sob o argumento de que o irmão sobrevivente teria dolosamente
ocultado o valor após a morte. Na ação, o espólio pedia ainda que o cotitular
perdesse o direito à partilha desse valor.
A ação foi parcialmente procedente em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu que os irmãos assinaram termo de solidariedade, estabelecendo que a conta poderia ser movimentada e encerrada isoladamente por qualquer um deles. Concluiu que o todo passou a pertencer a qualquer um deles, razão pela qual o valor poderia ser levantado apenas por um sem a necessidade de posterior inclusão na partilha de bens decorrente do falecimento.
Conta solidária
A relatora
do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que existem duas espécies
de conta-corrente bancária: a individual (ou unipessoal), em que há um único
titular que a movimenta por si ou por meio de procurador; e a coletiva (ou
conjunta), cuja titularidade é de mais de uma pessoa.
Segundo
ela, esta última pode ser fracionária, sendo movimentada apenas por todos os
titulares; ou solidária, em que qualquer um dos titulares pode movimentar a
integralidade dos fundos disponíveis, em decorrência da solidariedade dos
correntistas especificamente em relação à instituição financeira mantenedora da
conta, mas não em relação a terceiros, "sobretudo porque a solidariedade,
na forma do artigo 265 do Código Civil, somente decorre da lei ou do contrato, e
não se presume".
Ao
citar precedentes sobre o tema, a ministra ressaltou que "o cotitular de
conta-corrente conjunta não pode sofrer constrição em virtude de negócio
jurídico celebrado pelo outro cotitular e por ele inadimplido, podendo, nessa
hipótese, comprovar os valores que compõem o patrimônio de cada um e, na
ausência ou na impossibilidade de prova nesse sentido, far-se-á a divisão do
saldo de modo igualitário".
Para a ministra, esse mesmo entendimento deve ser aplicado na hipótese de superveniente falecimento de um dos cotitulares da conta conjunta. "A atribuição de propriedade exclusiva sobre a totalidade do saldo em razão de uma solidariedade que, repise-se, apenas existe entre correntistas e instituição bancária, representaria grave ofensa aos direitos sucessórios dos herdeiros necessários, de modo que a importância titularizada pelo falecido deverá, obrigatoriamente, constar do inventário e da partilha", afirmou.
Direitos sucessórios
O espólio também questionou a titularidade dos valores depositados na conta conjunta, mas, diante da ausência de esclarecimento sobre a matéria fática, havendo dúvidas sobre a propriedade do valor, a ministra entendeu que deve incidir a presunção de que o saldo existente ao tempo do falecimento pertencia a ambas as partes em igualdade de condições – razão pela qual o valor deverá ser dividido em cotas idênticas.
Quanto
à aplicação da pena de sonegados, Nancy Andrighi lembrou que o STJ já decidiu
que a aplicação dessa penalidade exige prova de má-fé ou dolo na ocultação de
bens que deveriam ser trazidos à colação. Na hipótese dos autos, a relatora
afastou a incidência da pena, uma vez que não havia prova segura da autoria e
da propriedade dos depósitos realizados na conta conjunta, razão pela qual não
seria razoável atribuir ao cotitular a prática de ato doloso, fraudulento ou de
má-fé.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1836130