12 de May de 2015
IMUNIDADE. ITBI. CISÃO TOTAL. ATIVIDADE PREPONDERANTE. ADQUIRENTE. TRANSMISSÃO DA TOTALIDADE DO PATRIMÔNIO. ART. 37, § 4º, DO CTN.

1. Incide ITBI na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica para realização de capital e na transmissão decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção da pessoa jurídica se a atividade preponderante da adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. Art. 156, §2º, I, da CR.

2. A atividade preponderante da adquirente é aferida a partir da receita operacional das transações decorrentes da venda ou locação de propriedade imobiliária ou da cessão de direitos relativos à sua aquisição. Art. 37, § 1º e 2º, do CTN.

3. O § 4º do art. 37 do CTN não assegura às pessoas jurídicas que tenham como atividade preponderante a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil a imunidade do ITBI na aquisição da totalidade do patrimônio de pessoa jurídica do exame das suas atividades preponderantes. Com efeito, cuida-se de parágrafo inserido no artigo relativo à definição da atividade preponderante e não norma autônoma sobre a imunidade. Dizer que o referido parágrafo garantiu a imunidade levaria a reconhecer a criação de regra de imunidade diversa do art. 156 da CR, que provocaria, também, o esvaziamento da própria norma constitucional, na medida em que, na transferência de bens e direitos pela incorporação e pela fusão, igualmente se opera a transmissão da totalidade do patrimônio, dado que a empresa incorporadora e a nova empresa criada pela fusão sucedem as empresas absorvida e a extinta em todos os direitos e obrigações (arts. 1.116 e 1.119 do CC). O § 4º exclui do cálculo da receita operacional aquelas decorrentes dos bens ou direitos que foram transmitidos em conjunto com a totalidade do patrimônio jurídico da pessoa alienante. Sua apuração, desta forma, utilizará as receitas das demais transações envolvendo a venda, locação ou cessão de direitos.

Recurso desprovido.

APELAÇÃO CÍVEL

VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Nº 70064096050

(N° CNJ: 0094983-59.2015.8.21.7000)

COMARCA DE CAXIAS DO SUL

GJC PLANEJAMENTO E CONSULTORIA LTDA

APELANTE

PLANEJAR CONSULTORIA, EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA

APELANTE

ABXPAR PARTICIPAÇÕES LTDA

APELANTE

POWER SERVIÇOS DE GERENCIAMENTOS LTDA

APELANTE

TREVI RJ PARTICIPAÇÕES LTDA

APELANTE

MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL

APELADO

SECRETÁRIO DA RECEITA DO MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO E DES.ª DENISE OLIVEIRA CEZAR.

Porto Alegre, 30 de abril de 2015.

DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

Presidente e Relatora

RELATÓRIO

GJC PLANEJAMENTO E CONSULTORIA LTDA, PLANEJAR CONSULTORIA, EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA., ABXPAR PARTICIPAÇÕES LTDA., POWER SERVIÇOS DE GERENCIAMENTOS LTDA. e TREVI RJ PARTICIPAÇÕES LTDA impetraram, em 08 de maio de 2013, mandado de segurança contra o SECRETÁRIO DA RECEITA DO MUNÍCIPIO DE CAXIAS DO SUL para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária relativa ao ITBI incidente “na transferência, para cada Impetrante, de 1/6 da fração ideal, correspondente a 30% da totalidade do empreendimento imobiliário denominado ‘Shopping Iguatemi Caxias’” (fls. 16/17). Nos dizeres da petição inicial, em razão da cisão da EGEC Par Empreendimento Imobiliário LTDA., cada uma das Impetrantes recebeu 1/6 da fração ideal do imóvel Shopping Iguatemi Caxias. Defenderam a não incidência de ITBI sobre a transferência da totalidade dos bens de empresa cindida, forte no artigo 37, §4º, do Código Tributário Nacional. Na decisão de fls. 153/154, a MM. Juíza a quo deferiu a tutela antecipada. Notificada, a autoridade coatora prestou informações. Alegou que (I) a Constituição da República veda a concessão de isenção heterônoma, (II) a isenção de ITBI ocorre apenas nos casos em que uma empresa incorpora todo o ativo da empresa cindida e (III) a atividade preponderante das empresas adquirentes é locação, compra e venda de imóveis, razão pela qual incide ITBI sobre a transmissão da fração ideal do bem, forte nos artigos 37, §1º, do Código Tributário Nacional e 42, da Lei Complementar n.º 42/94. O Ministério Público opinou pela concessão da segurança (fls. 250/253). Na sentença de fls. 269/270, o MM. Juiz a quo, Dr. Gérson Martins da Silva, denegou a segurança, condenando o Impetrante ao pagamento das custas processuais. Inconformados, tempestivamente, apelam os Impetrantes. Reiteram os argumentos deduzidos por ocasião da impetração do mandado de segurança. Apresentadas as contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal. Nesta instância o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso. É o relatório.

VOTOS

DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA (PRESIDENTE E RELATORA)

Discute-se, na presente ação, se a transmissão às Apelantes da fração ideal do imóvel pertencente à empresa EGEC Par Empreendimento Imobiliário LTDA, no qual está instalado o Shopping Iguatemi Caxias, em razão da sua extinção por meio da chamada cisão total operada pelo contrato de fls. 28/41, está ao abrigo da imunidade prevista no artigo 156, §2º, inciso I, da Constituição da República, ainda que as empresas adquirentes tenham como atividade preponderante a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.

Consideram as Impetrantes que lhes tendo sido transmitida a totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante – EGEC Par Empreendimento Imobiliário LTDA. – têm direito à imunidade, conquanto sua atividade preponderante seja a venda ou a locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição, por força do parágrafo 4º do artigo 37, do Código Tributário Nacional, verbis:

“O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição.

§ 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo.

§ 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.

§ 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data.

§ 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante.”

A interpretação que as Apelantes conferem a tal parágrafo importa em excluir a incidência do ITBI sobre a transmissão de bens e direitos a pessoas jurídicas cuja atividade preponderante seja a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição, na hipótese em que a transmissão dos bens e direitos se der em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante.

A sentença recorrida denegou a segurança ao entender que o parágrafo 4º do artigo 37 do Código Tributário Nacional não foi recepcionado pela Constituição de 1988, verbis:

“Acontece que a regra exceptiva do § 4º do artigo 37 do CTN não corresponde a nenhuma previsão constitucional, tratando-se, portanto, de norma hierarquicamente inferior com pretensão de imunizar.

Não existe essa possibilidade, já que a imunidade tributária constitui poder exclusivo do legislador constituinte.

Assim, a extensão da não incidência ali pretendida não representa mais do que regra de isenção classificável como heterônoma, na corretíssima interpretação do impetrado e segundo a doutrina:

‘A isenção é heterônoma quando o legislador de uma ordem de governo, com permissão constitucional, proíbe ao legislador de outra ordem de governo o exercício do poder de tributar. A distinção em relação à imunidade, na espécie, é feita a partir da hierarquia normativa. Enquanto a norma imunitória é constitucionalmente qualificada, a norma isencional hetorônoma é legalmente qualificada (lei complementar da Constituição).’ (cf. Sacha Calmon Navarro Coelho, in Curso de Direito Tributário Brasileiro, 13ª ed. Ed. Forense, 2014, Rio de Janeiro, pág. 135). (sem grifo no original)

No caso do ITBI não existe essa permissão constitucional para isenção hetorônoma, que tem de ser expressa, até porque é expressa a limitação na CF:

‘Art. 151. É vedado à União:

(....)

III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.’

Se não existe autorização constitucional para que a lei complementar federal conceda isenção do ITBI, que é de competência municipal, a única conclusão possível é no sentido de que o § 4º, em exame, não foi recepcionado pela Constituição.

No caso das impetrantes, mesmo que a cisão tenha importado na transmissão da totalidade do patrimônio da empresa cindida, é devido o ITBI.”

À interpretação do parágrafo 4º do artigo 37, afigura-se indispensável ter presente a sua topologia. Com efeito, cuida-se de norma que integra dispositivo legal cujo objeto é a disciplina dos critérios para determinar se a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição é a atividade preponderante da pessoa jurídica adquirente.

Não trata, portanto, o artigo 37 das hipóteses de imunidade, as quais já foram fixadas pela Constituição da República e pelo artigo 36 do Código Tributário Nacional.

Seu objeto é tão somente a definição dos critérios para o enquadramento da atividade preponderante da pessoa jurídica adquirente.

Não se cuida, assim, de parágrafo que encerra norma autônoma sobre a imunidade do ITBI, para eximir a pessoa jurídica que adquire a totalidade do patrimônio de pessoa jurídica do requisito da preponderância das suas atividades. Tal, aliás, levaria ao reconhecimento de que o parágrafo 4º criou nova regra de imunidade diversa do artigo 156 da Constituição da República, a saber: não incide ITBI sobre a transmissão de bens e direitos realizada em conjunto com a totalidade do patrimônio da pessoa alienante independentemente da atividade preponderante da pessoa adquirente.

Não é esse, contudo, o sentido do parágrafo 4º do artigo 37 do Código Tributário Nacional.

Aliás, releva destacar que sequer houve, no caso, a transmissão de bens ou direitos em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante. É que o patrimônio da EGEC Par Empreendimento Imobiliário LTDA. não foi transmitido na totalidade a um alienante. Seu patrimônio foi divido em seis partes e transmitido 1/6 parte a cada uma das Apelantes.

A propósito, essa exegese provocaria, também, o esvaziamento da própria norma constitucional, na medida em que, por exemplo, na transferência de bens e direitos pela incorporação e pela fusão, igualmente opera-se a transmissão da totalidade do patrimônio, dado que a empresa incorporadora e a nova empresa criada pela fusão sucedem as empresas absorvida e extinta em todos os direitos e obrigações (artigos 1.116[1] e 1.119[2] do Código Civil).

Ora, as imunidades previstas no artigo 156, §2º, inciso I, da Constituição da República tanto pela incorporação de bens para realização de capital quanto decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica “caem por terra se a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil”[3].

Cumpre, então, precisar o sentido e finalidade do parágrafo 4º do artigo 37 do Código Tributário Nacional, segundo o qual “O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante”.

Ora, não aplicar o artigo 37 à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante, significa não levar em conta a receita operacional obtida com a venda ou locação de tais bens no cálculo da atividade preponderante da adquirente. Com efeito, é de apuração da atividade preponderante que trata o artigo 37 e não das hipóteses de imunidade do ITBI.

O parágrafo 4º do artigo 37 excepciona da receita operacional, para fins de cálculo da atividade preponderante, as transações com os referidos bens ou direitos. Em outras palavras, excluiu o legislador do cálculo da receita operacional aquelas decorrentes dos bens ou direitos que foram transmitidos em conjunto com a totalidade do patrimônio jurídico da pessoa alienante. Sua apuração, então, utilizará as demais receitas envolvendo a venda, locação ou cessão de direitos.

Não há, assim, imunidade na transmissão do imóvel do Shopping Iguatemi Caxias às Apelantes, porquanto, como referido na sentença, “ao invocar a regra do § 4º do artigo 37 do CTN, admitem que, ao menos num primeiro momento, não estariam beneficiadas pela norma de imunidade constante do artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal”, tanto que não pediram a concessão da imunidade sob condição resolutiva.

Por estes fundamentos, restam prejudicadas as alegações de que o parágrafo 4º do artigo 37 não foi recepcionado pela Constituição de 1988.

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.

DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª DENISE OLIVEIRA CEZAR - De acordo com o(a) Relator(a).

DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA - Presidente - Apelação Cível nº 70064096050, Comarca de Caxias do Sul: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: GERSON MARTINS DA SILVA

Disponível no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

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