23 de March de 2015
Nulidade de testamento. Discernimento. Validade

Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl

Tema(s): Nulidade de testamento Discernimento Validade

Tribunal TJRS

Data: 20/03/2015

(...) “Examinando criteriosamente a prova testemunhal produzida, constata-se, com segurança, que no momento da lavratura do testamento a testadora estava lúcida e tinha plena capacidade para o ato.” (...)

RMLP

Nº 70063343958 (Nº CNJ: 0019773-02.2015.8.21.7000)

2015/Cível

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO DE nulidade DE TESTAMENTO. DISCERNIMENTO À ÉPOCA DA TESTIFICAÇÃO. CAPACIDADE TESTAMENTÁRIA ATIVA. ART. 1.860 DO CC/02. SENTENÇA MANTIDA. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 535 DO CPC. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA.

1. O cabimento de embargos de declaração limita-se às hipóteses elencadas pelo art. 535 do CPC, inocorrentes no acórdão impugnado.

2. Os embargos de declaração não se prestam para o objetivo de rediscussão da matéria já decidida, como a parte embargante, em realidade, pretende, pela linha de argumentação das razões do recurso que ofertou.

EMBARGOS DECLARATÓRIOS DESACOLHIDOS.

Embargos de Declaração

Oitava Câmara Cível

Nº 70063343958 (Nº CNJ: 0019773-02.2015.8.21.7000)

Comarca de Antônio Prado

VITORIO LUIZ DE BORTOLI

EMBARGANTE

SEVERINO ADOLFO DE BORTOLI

EMBARGADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desacolher os embargos declaratórios, nos termos dos votos a seguir transcritos.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (Presidente) e Dr. José Pedro de Oliveira Eckert.

Porto Alegre, 05 de março de 2015.

DES. RICARDO MOREIRA LINS PASTL,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Ricardo Moreira Lins Pastl (RELATOR)

Trata-se de embargos de declaração opostos por VITORIO LUIZ de B. e por ODILES OLINDA K. contra acórdão proferido na AC nº 70062280805, interposto nos autos da na ação de nulidade de testamento público movida em desfavor de SEVERINO A. de B. e de PEDRO IRINEU de B.

Após transcreverem excerto da sentença, defendem que a sentença incorre em vício ante a indução em erro do douto magistrado quanto ao fato de que “no dia 25 de novembro ela estava lúcida e consciente, havendo piora do quadro geral no dia 26 de novembro”, questionando a validade do testamento lavrado nessa última data.

Sustentam que o conhecimento do erro apontado exige a reforma da decisão de primeiro grau, devendo este órgão recursal reapreciar a lide e verificar a procedência de seus pedidos.

Alegam que a testadora apresentou piora em seu quadro clínico geral ainda no dia 25 de novembro de 2008 e que no dia 26 de novembro, às 12 horas, não mais respondia a estímulos e chamados.

Assim, pugnam pelo acolhimento dos aclaratórios, a fim de que seja apreciado “forma fundamentada a alegação de error in judicando, conforme apontado em sede de recurso de apelação e novamente no corpo desta petição, inclusive para fins de pré-questionamento” (fls. 758/766).

É o relatório.

VOTOS

Des. Ricardo Moreira Lins Pastl (RELATOR)

Eminentes colegas, recebo os presentes embargos de declaração, adiantando que não merecem acolhimento, uma vez que inexiste no acórdão das fls. 736/743, qualquer obscuridade, contradição ou omissão, porquanto analisou a insurgência apresentada em consonância com o ordenamento jurídico vigente e com os elementos probatórios constantes no processo.

A parte embargante, pelo teor da motivação de seus embargos, na verdade, pretende rediscutir a matéria já decidida, objetivo para que não se prestam os embargos de declaração, na medida em que o Colegiado explicitou de maneira clara e precisa os fundamentos pelos quais afastou a nulidade do testamento, reconhecendo a capacidade testamentária ativa da falecida.

Veja-se:

No caso, após analisar detidamente os autos, entendo que a sentença não comporta qualquer reparo, visto que a prova coligida é robusta no sentido de que, não obstante a gravidade da doença (tumor cerebral), a testadora estava lúcida e gozava de pleno discernimento quando confeccionou seu testamento em 26.11.2008 (fl. 35), restando afastada, portanto, a tese de que, quando da testificação, Elidia (falecida em 28.11.2008, fl. 37) não detinha capacidade testamentária ativa.

Nesse tópico, consigno que o parecer médico juntado nas fls. 443/447, de lavra do Dr. Avelino Guzi, a pedido dos autores, além de não encontrar guarida nas demais provas, foi confeccionado apenas com base nos prontuários médicos, sem que tenha havido qualquer contato pessoal com a de cujus, que, ressalto, não era sua paciente.

Ademais, conforme se depreende das cartas acostadas nas fls. 289/301 e do testemunho de Leondina Maria de B. C (fls. 380/381), a relação entre a doadora e os autores, em especial com o seu irmão Vitorio, era conflituosa, razão pela qual não impressiona a disposição de última vontade da falecida beneficiando somente os demais irmãos.

No mais, para evitar desnecessária repetição e, principalmente, por entender que esgotou o completamente o exame da matéria, peço licença para reportar-me a lúcida fundamentação do insigne Procurador de Justiça, Dr. ALCEU SCHOELLER DE MORAES, adotando-a como razões de decidir:

Cuida-se de examinar a higidez do testamento público deixado por Elidia de Bortoli, porquanto argumentam os Apelantes, herdeiros colaterais, que, ao tempo da lavratura, a irmã e testadora não tinha capacidade mental, pois estava em estado terminal, em leito hospitalar, em decorrência de tumor celebral, sem qualquer discernimento para a prática do ato.

Inicialmente importa salientar que o fato de a testadora não ter assinado o testamento de próprio punho, fazendo-o uma das testemunhas instrumentárias a seu rogo, não é causa a invalidar.

Em casos tais, a exigência legal é de que o ato de disposição de última vontade seja declarado em testamento público e nele o Tabelião faça constar a informação de que o testador não pode assinar, assinando a rogo uma das testemunhas instrumentárias.

Há previsão expressa no art. 1.865 do Código Civil:

Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

Segundo consta na cópia do testamento acostada à fl. 35, o Tabelião Substituto adotou as providências devidas, consignando que:

“E por estar conforme inteiramente com o seu desejo e declarações, aceitou, outorga e, estando impossibilita fisicamente de assinar, deixa à margem desde instrumento a impressão digital de seu polegar direito, assinando a rogo a testemunha ADRIANA GOULART ISOTTON...”

Portanto, nenhuma mácula há no testamento, relativamente a esse tópico.

No mais, quanto à alegação de que o testamento lavrou-se quando a testadora estava incapaz, internada no Hospital Pompéia, na cidade de Caxias do Sul, em estado terminal em decorrência de tumor cerebral, desmerece acolhida.

É sabido que não podem testar aqueles que, para o ato, não tiverem o pleno discernimento (art. 1.860 do CC).

Contudo, a mera alegação de incapacidade apoiada no fato de a testadora estar debilitada, devido ao seu estado de saúde física, caso desacompanhada de prova robusta e inconteste de que no ato da feitura do testamento faltava-lhe higidez mental, não será suficiente para inquinar a declaração de última vontade.

Consoante se verifica à fl. 37, o testamento público foi lavrado no dia 26 de novembro de 2008, “no quarto 301, do Hospital Pompéia de Caxias do Sul”, pelo Tabelião Substituto Rodrigo Werlang Isolan e na presença das testemunhas instrumentárias Adriana Goulart Isotton e Gabriela Fontanella.

É nesta data, especialmente no momento da lavratura do testamento, portanto, que se deve aferir a higidez mental da testadora, pouco importando se posteriormente já não mais se encontrava em condições de dispor.

O óbito da testadora ocorreu em 28 de novembro de 2008 (fl. 37), dois dias depois de ser lavrada a declaração de sua última vontade.

Ao exame dos prontuários médicos, em especial o que consta consignado no dia 26 de novembro de 2008, verifica-se que, tais documentos, por si só, não são suficientes a atestar que a testadora não apresentava lucidez e discernimento para a prática do ato, conforme defendem os Apelantes. [grifei].

Vale transcrever, à fl. 222-v:

“26-11-08 – 3hs – Elidia (...) atende a chamados com dificuldade (...)”

26-11-08 – paciente mal estado geral pouco responsiva em mascara (...) converso com familiares (...)

26-11-08 – 9h45min – paciente em MEG (...), muito pouco responsiva, hipocorada, períodos de dispneia, com O2 ON a 5l/min (...) iniciou com dieta por SNE + medicação (...)”

À fl. 223:

“26-11-08 – 12h – Paciente sonolenta, não responde mais a solicitações e chamados, em máscara, com presença de líquido extracelular em extravasamento exterior em membros superiores, presença de SNE, não aceita nada via oral, MEG SVE, porém com respiração dificultosa. O2 em ON (...) segue em cuidados de enfermagem.

26-11-08 – 14h45min – Paciente sonolenta, pouco responsiva, aceitando dieta por sonda nasoenteva, ventilando com auxílio de O2 por óculos nasal, realizando sonoterapia mais reparina em BI, diurese presente em fralda e evacuação ausente, paciente edemaciada, segue Cuidados de enfermagem. (Mirian Gomi, Tec. Enfermagem, COREN 19101).”

“26-11-08 – Plantão Clínico – Paciente com meningite em PO de retirada de tumor cerebral e manejando suspeita de TEP.

Mau estado geral.

Apresentando desnaturação com O2 for ON e referindo dor.

Defino como manejo de suporte pela família e equipe assistente.

Deixo com O2 MV Fc/min contínuo.

Inicio com Mortina 3ml EV 4/4h.

Demais COM. (Leonardo G. H. Signori, médico).”

Embora a evolução clínica anotada pela equipe de enfermagem e médico que assistiram a testadora no dia em que fora lavrado o testamento indique que seu estado não era bom, estava sonolenta e pouco responsiva, não há qualquer anotação de que estivesse incapacitada de compreender o que com ela se passava naqueles momentos finais de sua vida, ou seja, estava lúcida e orientada. [grifei].

Ao contrário, consta que Elidia referiu dor ao médico que a atendeu no período da tarde, do dia 26 de novembro, depois das 14h45min. E naquele dia, não estava entubada ou sedada, nem mesmo em estado comatoso.

Quanto ao estado de saúde, embora fisicamente debilitada, o médico Dr. Leonard R. F. de B., atestou a capacidade e a higidez mental da testadora para a prática do ato, tanto que consignado pelo Tabelião Substituto no instrumento:

“5- Que, mesmo estado ela testadora em pleno uso e gozo de suas faculdades intelectuais e mentais, conforme já referido, e mesmo não havendo exigência legal, apresentou-me atestado médico de tal capacitação emitido pelo seguinte médico: Dr. Leonard R. F. de B., CREMERS 30.747. (...)”. [grifei].

Ouvido em Juízo, o médico Leonardo Gilberto H. S. (CD de áudio e vídeo da fl. 622) disse que foi residente de medicina no Hospital Pompéia entre os anos de 2008 e 2009. Inicialmente não lembrou da testadora e seus familiares, mas após ter vista dos prontuários médicos acostados aos autos, esclareceu que no dia 26 de novembro de 2008, à tarde atendeu a paciente quando evoluiu com piora de sensório, referindo que antes disso ela mantinha nível de consciência, colaborativa, sem piora de sensório como descrito pelo neurocirurgião no prontuário médico no dia 25, cuja piora ocorreu nas 24 horas subsequentes, apontando o período da tarde do dia 26 de novembro. Esclareceu que a evolução “mau estado geral”, constante no prontuário do dia 26, à tarde, (fl. 223) significa que a paciente “vinha piorando sinais vitais, com pressão mais baixa, um pouquinho taquiepineica que é um aumento da frequência respiratória, por causa da infecção que não estava sendo controlada”. Referiu que a testadora usava oxigênio em decorrência da meningite e da suspeita de tromboembolismo pulmonar, que não chegou a ser confirmada, pois não realizado exame na ocasião. Isso teria acarretado a piora no quadro geral da paciente. A complicação do quadro de saúde da testadora se deu em razão da associação das patologias que sofria (pós-operatório de neurocirurgia, meningite e embolia pulmonar). Mencionou que, segundo consta nos prontuários, no dia 26, na parte da tarde, foi iniciada medicação com sedação para conforto da paciente em razão da piora no seu estado de saúde, confirmando que quando viu a paciente, no dia 26 de novembro, no período da tarde, ela já estava com prejuízo no grau de sensório, tendo conversado com os familiares para ser feita a sedação com o intuito de aliviar o sofrimento e dar conforto à paciente. Afirmou que o início da medicação para a sedação teve início no dia 26, à tarde, quando prescreveu a medicação. Assegurou, analisando o que constou no prontuário médico, que da evolução da paciente, até o momento em que ele a viu, no período da tarde do dia 26 de novembro, ela estava lúcida e tinha plenas condições de realizar testamento. Reafirmou que um paciente pode estar apresentar mau estado geral (MEC) e mesmo assim ter preservado seu nível de consciência. Mais uma vez disse que até o momento em que fora iniciada a medicação da sedação, e pelo que consta no prontuário médico, a paciente tinha preservadas as funções mentais, estava em plenas condições mentais. Afirmou que a testadora não estava entubada, recebendo oxigênio via nasal, podendo se comunicar normalmente. Insistiu dizendo que o fato de a testadora estar acometida de meningite, em decorrência da própria cirurgia neurológica, segundo o que está descrito no prontuário acostado aos autos, não causou prejuízo sensório, estando preservado o nível de consciência. Finalizou dizendo que, quando atendeu a paciente, depois das 14h45min do dia 26 de novembro, até aquele momento, apesar da paciente estar sonolenta, ela tinha preservados seus níveis de consciência e perfeito estado sensório, referindo a anotação feita pelo neurocirurgião, no dia anterior, pessoa mais indicada para a análise nesse sentido.

As testemunhas instrumentárias (CD de áudio da fl. 490) confirmaram a capacidade de Elidia para a prática do ato.

Gabriela F. (CD de áudio da fl. 490), técnica de enfermagem do Hospital Pompéia, disse que estava presente no momento em que foi lavrado o testamento. Referiu que no quarto do hospital estavam presentes o Tabelião, a Dona Elidia e a outra testemunha instrumentária, sem que com ela estivessem os irmãos. Assegurou que Elidia estava lúcida e consciente no momento em que foi lavrado o testamento. Disse que cuidou da testadora enquanto ela esteve hospitalizada e que, após a cirurgia realizada, ela se recuperou bem, tinha consciência. Lembrou que ela assinou com a digital e não soube a razão, pensando que poderia ser analfabetismo. Esclareceu o que foi por ela redigido no prontuário médico constante do dia 26 de novembro, mencionando que a sonda para alimentação via nasal ou oral não impede a fala. Relatou que o testamento foi lavrado pela manhã, antes das 9h da manhã, lembrando que foi antes do café, que ocorre entre às 8h às 9h30min, ocasião em que ela conversava. Esclareceu que a evolução constante do prontuário como “pouco responsivo” ocorre quando o paciente responde ao chamado, mas não conversa muito, apenas se solicitado. Reafirmou que a testadora estava consciente, lúcida e conversava no momento em que o Tabelião realizou o testamento, embora tivesse dificuldade de locomoção. Além disso, considerando o quadro de evolução do paciente, disse que um paciente pode, em cinco minutos, ter queda de sensório e até morrer, ou então, nesse mesmo tempo ter melhora considerável.

Adriana G. (CD de áudio em vídeo fl. 490), que à época trabalhava no Hospital Pompéia como higienizadora (fazia limpeza nos quartos do hospital), disse que estava presente no ato da lavratura do testamento. Lembrou que a testadora estava lúcida e consciente no momento que o Tabelião leu o instrumento e fez perguntas a ela. Referiu que no dia seguinte em que o testamento foi lavrado esteve novamente no quarto em que a testadora estava e ela se encontrava bem e que conseguia conversar. Referiu que a testadora estava com oxigênio no nariz e que o Tabelião leu por duas vezes as disposições de última vontade, referindo às testemunhas que somente assinariam o instrumento se a testadora estivesse consciente. Assegurou que a testadora entendeu o que o Tabelião leu e consentiu com os termos do testamento. Mencionou, ainda, que a testadora, cedo pela manhã, recebeu a visita do Ministro da Eucaristia, tendo comungado e com ele rezou.

Zélia Maria C. B., técnica de enfermagem (CD de áudio da fl. 490), disse ter acompanhado o tratamento da testadora, prestando cuidados no período da noite. Não esteve presente no ato do testamento, mas na noite anterior, ocasião em que ela estava responsiva e lúcida. Referiu também que ela sempre esteve lúcida, até “perto de morrer”. Esclareceu parte do prontuário médico que lhe foi solicitado durante o seu depoimento, dizendo que “pouco responsiva” ou “atende a chamados com dificuldade” significa que o paciente entende tudo que lhe é perguntado, mas não conversa muito, não tem iniciativa para conversar. [grifei].

Leondina Maria de B. C., irmã da testadora, em seu depoimento das fls. 378/388, relatou saber que sua irmã expressou desejo de fazer o testamento e de que esteve sempre lúcida durante o tempo da internação, tanto que um dia antes de falecer com ela esteve no hospital, quando houve piora no seu estado de saúde. Apesar de não ter ido visitar a irmã no dia 26 de novembro, data da lavratura do testamento, referiu que ela estava lúcida. Referiu questões familiares, em especial desentendimentos entre a testadora os irmãos, ora Apelantes, salientando que o desejo dela sempre foi o de deixar seus bens aos outros irmãos, ora Apelados, os quais sempre lhe prestaram auxílio.

A testemunha Ernilda Maria C. T. prestou compromisso e, em seu depoimento das fls. 424/429, afirmou ter visitado a testadora no hospital, no dia em que o testamento foi lavrado. Disse que ela estava lúcida, tendo ambas conversado, ocasião em que lhe referiu: “tivesse chegado um pouco antes tu encontrava o escrivão’, ela começou por ali, - ‘Tu encontrava aqui o escrivão’, ela disse: ‘-Que veio aqui porque eu quis fazer testamento’. Antes ela ainda falou o seguinte: ‘-Eu fiz uma coisa que meu pai fez pra mim’ eu sabia que o pai tinha dado para ela, tinha feito testamento, já sabia disso tudo, ainda da época né. Ela disse: ‘-Hoje fui eu que fiz, fiz pros meus irmãos, pro Pedro e pro Severino porque sempre me ajudaram, sempre estiveram aqui e sempre me apoiaram’ e todas essas coisas assim né, como era a vida dela né. E ela estava muito contente de ter feito e me pergunto... não, não me perguntô, Me mostrô o dedo e começo a ri, brincando ela disse: ‘-Olha me fizeram, botaram um dedo, ela disse’ ela foi assim, normal, como ela era simples, assim, ela disse: ‘Me botaram o dedo, depois limparam, mas não saiu ainda tudo, ainda tem’ e ria sabe? Ela...”. [grifei].

Examinando criteriosamente a prova testemunhal produzida, constata-se, com segurança, que no momento da lavratura do testamento a testadora estava lúcida e tinha plena capacidade para o ato.

A prova produzida nos autos foi esclarecedora de que o testamento lavrou-se no período da manhã do dia 26 de novembro de 2008, antes das 9h, e que, somente à tarde, depois das 14h45min, iniciaram a medicação com sedação porque a testadora declinou no seu estado de saúde. [grifei].

Elidia estava apta e tinha plena lucidez ao testar. Se houve piora das condições de saúde após a lavratura do testamento, notadamente quanto ao seu sensório, desimporta, uma vez que a capacidade para a prática do ato afere-se no momento em que é realizado, não antes, nem depois.

Tanto é assim que, segundo referido pela técnica de enfermagem Gabriela F., um paciente pode, em cinco minutos, ter queda de sensório e até morrer ou melhorar.

Desse modo, se há um hiato de melhora dentro do quadro clínico do paciente, com preservação dos níveis de consciência e sensório, nada impede que pratique um ato civil, como é o outorgar testamento.

Os depoimentos das testemunhas arroladas, em especial os das instrumentárias e do médico que atendeu a testadora no dia em que o testamento foi lavrado, guardam harmonia e coerência, entre si e com a prova documental, em especial o prontuário hospitalar, além de detalhar os fatos ocorridos naquela data.

Vale destacar que a Tabelião deu fé da capacidade da testadora quando ela declarou sua última vontade (fl. 35).

Em amparo:

APELAÇÃO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TESTAMENTO. IMPROCEDÊNCIA. ADEQUAÇÃO. Caso em que os médicos que atendiam o "de cujus" confirmaram que, mesmo com medicação psicotrópica administrada, a testadora tinha lucidez, sendo cíclicos os estados de alteração mental, sonolência. Relato corroborado pelas testemunhas e pelo tabelião do cartório onde confeccionada a disposição de última vontade que confirmou a capacidade da testadora. Hipótese de adequado o julgamento de improcedência do pedido de anulação de testamento, por falta de provas sobre a alegada falta de discernimento e capacidade do testador. NEGARAM PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70061269791, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 25/09/2014).

ANULAÇÃO DE TESTAMENTO. CAPACIDADE CIVIL. AUSÊNCIA DE VÍCIOS DE CONSENTIMENTO E DE FORMA. 1. O testamento, que foi feito com a observância dos requisitos legais, é um ato jurídico válido, perfeito e acabado, que ganhou eficácia com o óbito da testadora, desencadeando os efeitos dele decorrentes. 2. A idade avançada e os problemas de saúde enfrentados pela testadora, não ensejaram a sua incapacidade civil, sendo que as testemunhas que presenciaram a feitura do testamento e as que prestaram depoimentos em juízo confirmam a plena higidez mental dela. 3. Os honorários devem ser fixados de forma a remunerar adequadamente o advogado da parte, não merecendo reparo a sentença quando atende o disposto no art. 20, § 4º, do CPC. Recurso desprovido. (Apelação Cível Nº 70057614430, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 29/01/2014).

APELAÇÃO CÍVEL. SUCESSÕES. TESTAMENTO. NULIDADE DA DECLARAÇÃO DE VONTADE POR INCAPACIDADE MENTAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PROVA QUE INDICA A CAPACIDADE PARA TESTAR, ALIADA À CONSTATAÇÃO DO TABELIÃO QUANDO DA REALIZAÇÃO DO ATO. Evidenciada pela prova dos autos a capacidade do testador para o ato de disposição de última vontade, não tendo sido comprovado qualquer vício que possa macular a higidez do testamento, válida é a disposição feita em tabelionato, mediante escritura pública, na presença de duas testemunhas. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70032855777, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Conrado Kurtz de Souza, Julgado em 13/01/2010).

Portanto, a Sentença não merece qualquer reparo, devendo ser confirmada por seus próprios fundamentos [grifos no original] (fls. 729/734).

Destarte, em razão da ausência de prova acerca da incapacidade testamentária ativa da falecida, cujo ônus incumbia aos autores, como prescreve o art. 333, I, do CPC, a manutenção da sentença improcedência é medida que se impõe.

Observa-se, assim, a nítida intenção da embargante de travar novo debate sobre a matéria, pois está inconformada com a solução endereçada por esta Corte, o que, como dito, é incabível em sede de embargos de declaração (v. g., ED nº 70045052248, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator Luiz Felipe Brasil Santos, 22/09/2011; ED nº 70041952037, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator Rui Portanova, 28/04/2011; ED nº 70035519636, Oitava Câmara Cível, TJRS, Relator Alzir Felippe Schmitz, 29/04/2010).

ANTE O EXPOSTO, desacolho os embargos de declaração.

Dr. José Pedro de Oliveira Eckert - De acordo com o (a) Relator (a).

Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (PRESIDENTE) - De acordo com o (a) Relator (a).

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - Presidente - Embargos de Declaração nº 70063343958, Comarca de Antônio Prado: "DESACOLHERAM. UNÂNIME."

Julgador (a) de 1º Grau: NILTON LUIS ELSENBRUCH FILOMENA

Disponível na Jurisprudência do IBDFAM, do Dia 20 de Março de 2015

http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/3113/Nulidade%20de%20testamento.%20Discernimento.%20Validade