19 de March de 2019
STJ: Tributário – ITCMD – Doação que teria sido detectada na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física, decorrente de valor acima da meação na partilha formalizada no divórcio – Bens adquiridos durante a separação de fato são incomunicáveis – O montante dos aquestos se verifica na data em que cessou a convivência (art. 1.83 do Código Civil) – Não caracterização do fato gerador do tributo – Desconstituição da obrigação tributária – Sentença de improcedência – Recurso provido.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.127.759 – SP (2017/0158241-8)

RELATORA: MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES

AGRAVANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ADVOGADO: REINALDO A CHELLI – SP110805

AGRAVADO: LUIS CLÁUDIO PANDINI

ADVOGADO: JORGE DE MELLO RODRIGUES – SP197764

DECISÃO

Trata-se de Agravo, interposto pela FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, em 07/10/2016, contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que inadmitiu o Recurso Especial manejado em face de acórdão assim ementado:

“TRIBUTÁRIO. ITCMD. Doação que teria sido detectada na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física, decorrente de valor acima da meação na partilha formalizada no divórcio. Bens adquiridos durante a separação de fato são incomunicáveis. O montante dos aquestos se verifica na data em que cessou a convivência (art. 1.83 do Código Civil). Não caracterização do fato gerador do tributo. Desconstituição da obrigação tributária. Sentença de improcedência. Recurso provido” (fl. 278e).

O acórdão em questão foi objeto de Embargos de Declaração, rejeitados nos seguintes termos:

“EMBARGOS DECLARATÓRIOS. Não é omisso acórdão que não padece das falhas apontadas. Pretendida infringência do julgado que deve ser buscada nas vias próprias. Embargos rejeitados” (fl. 295e).

Sustenta a parte agravante, nas razões do Recurso Especial, que o acórdão recorrido violou os arts. 38 e 123 do CTN e 333 e 334 do CPC/73, pelos seguintes fundamentos:

“Dos fatos narrados na inicial conclui-se que houve a separação de fato do autor no ano de 2005. O divórcio foi formalizado por  escritura  pública, em janeiro de 2008. Foi instaurada verificação fiscal pelo Posto Fiscal de Araçatuba, no ano de 2013, com base no confronto das declarações de rendas apresentadas no ano – base de 2008, exercício 2007, pelo autor e sua ex-cônjuge.

O Recorrido, na esfera administrativa, opôs-se às conclusões fiscais de que houvera excesso de meação a seu favor, com base  nas declarações de rendas apresentadas. Apresentou documentos e a escritura de divórcio lavrada, e requereu que o ITCMD fosse calculado com base na  escritura apresentada, desconsiderando as declarações  de rendas, afirmando que foram valores adquiridos  após a  separação de fato. A escritura pública de divórcio não citou qualquer valor em dinheiro no momento da separação, seja de fato ou de direito.

Ela incluíra tão somente os bens imóveis do casal, e referida partilha. Entretanto, na esfera administrativa, com base nos documentos apresentados, o fisco reviu o valor inicial apurado e calculou a diferença devida, com base em tais documentos. O recorrido, na esfera administrativa, não conseguiu comprovar documentalmente que não houvera excesso de meação a seu favor com base nos bens que possuíam por ocasião da separação de fato, razão pela qual foi lavrado  o Auto de Infração e Imposição de multa. TAMBÉM NÃO COMPROVOU JUDICIALMENTE, RAZÃO DO IMPROVIMENTO DA AÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA.

(…)

É fato provado nos autos, que se observa na declaração de rendas, valores citados no próprio acórdão ora recorrido, que existiu um acréscimo/decréscimo proporcional de dinheiro na conta dos divorciandos, que demonstram que no momento da separação de fato existia sim dinheiro a ser partilhado, que não foi incluído na Escritura de divórcio.

É fato provado nos autos que o autor não comprovou quais valores existiam nas contas dos cônjuges no momento da separação de fato, razão pela qual o fisco baseou-se na declaração de rendas à qual teve acesso, ou seja, da data do divórcio.

É fato provado nos autos que o recorrido, em sua inicial, CONFESSA que ficou com valor superior de dinheiro porque passou a arcar com todas as despesas dos filhos.

(…)

Como se vê o legislador estadual, com supedâneo no art. 155, I da CF e art. 38 do CTN, e demais artigos supra mencionados, no capítulo I da Lei 10.705/00, alterada pela Lei 10.992/01 define que o ITCMD incide sobre o excesso de meação.

A questão é objetiva. Não é questão de escolha das partes se é doação ou não, como entendido pelo v. Acórdão ora recorrido. Deve-se apurar o patrimônio e partilhá-lo na  forma prevista na  lei material. O que fugir disso beneficiando um ou outro cônjuge, é excesso de  quinhão. Sendo os bens  tributáveis  e não incidindo isenção, incide o imposto.

(…)

A quem compete a prova do excesso de meação?

Inicialmente ao fisco. Ele o fez, na confrontação entre a escritura de divórcio e a declaração de rendas.

(…)

Ora, o autor não conseguiu provar seu direito. Não comprovou o patrimônio no momento da separação de fato” (fls. 304/307e).

Requer, ao final, o provimento do  Recurso Especial  para manter  a improcedência da ação do contribuinte.

Em contrarrazões, a parte ora agravada assevera que a matéria recursal não foi prequestionada e que o recurso encontra óbice na Súmula 126 do STJ. No mérito, sustenta que a jurisprudência do STJ encontra-se no mesmo sentido do acórdão recorrido, quanto à incomunicabilidade dos bens adquiridos após a separação de fato dos cônjuges.

Negado seguimento ao Recurso Especial (fl. 327e), foi interposto o presente Agravo (fls. 329/337e).

Contraminuta às fls. 339/347e.

A irresignação não merece acolhimento.

A Corte de origem, a partir do exame dos elementos fáticos do caso, concluiu pela inexistência de ganho patrimonial de um dos cônjuges a justificar a caracterização de doação, com a consequente incidência do ITCMD, como se vê do seguinte trecho:

“O ITCMD não é imposto sobre a partilha, mas sobre a doação a título gratuito, ou seja, a hipótese de incidência é, genericamente, a transmissão gratuita por ato inter vivos ou causa mortis, a não ser que haja convenção expressa sobre a liberalidade, nos termos do art. 538   do Código Civil (Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere de seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra). Bem por isso, é a única hipótese em que a partilha deve ser apresentada ao fisco.

Formalizado o divórcio direto em janeiro de 2008, comprovada a separação de fato há mais de dois anos e declarada a existência de dois imóveis partilhados de forma igualitária e considerando a norma do art. 1.683 do Código Civil, segundo a qual ‘na dissolução do regime de bens por separação judicial ou por divórcio, verificar-se-á o montante  dos aquestos à data em que cessou a convivência’, da declaração do imposto de renda do exercício de 2008, ano-calendário 2007, não se pode considerar a evolução patrimonial dos ex-cônjuges e interpretar a diferença como sendo doação.

Com efeito, das declarações de renda reproduzidas a f. 65 e ss., verificando-se a evolução patrimonial (critério utilizado pelo fisco), vê-se que a ex-mulher declarou possuir em 31.12.2007, bens e direitos equivalentes a R$ 169.859,45 e em 31.12.2008, R$ 302.267,18. Já o apelante declarou em 2007 o patrimônio de R$ 789.201,89 e em 2008, R$ 672.122,91. Observa-se, ainda, que ambos adquiriram bens e contraíram dívidas no mesmo período, não se vislumbrando no que consistiria o excesso de meação.

É pacífico o entendimento jurisprudencial sobre a  incomunicabilidade dos bens adquiridos após a separação de fato e antes do divórcio, tanto quanto das dívidas contraídas por cada um dos cônjuges.

(…)

A divergência nas declarações de renda dos ex-cônjuges não implica, necessariamente, doação, não podendo o Estado instituir ITCMD em situação não autorizada pelo art. 155, I, da CR em afronta ao princípio  da legalidade, por inexistente o fato imponível.

Demonstrado documentalmente que a partilha igualizou a divisão patrimonial (escritura de divórcio), não há incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de quaisquer bens ou direitos, impondo-se a anulação do auto de infração” (fls. 280/285e).

Desse modo, não há como rever tal juízo de fato em virtude da incidência do óbice da Súmula 7/STJ.

Em face do exposto, com fundamento no art. 253, parágrafo único, II, a, do RISTJ, conheço do Agravo para não conhecer do Recurso Especial.

Em atenção ao disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015 e no Enunciado Administrativo 7/STJ (“Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do NCPC”), majoro os honorários advocatícios anteriormente fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) para R$ 2.000,00 (dois mil reais), levando-se em consideração o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida, em virtude da interposição deste recurso, respeitados os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do CPC/2015.

I.

Brasília, 1º de agosto de 2017.

MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES

Relatora

Fonte: STJ

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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