15 de June de 2016
Sucessões. Inventário e partilha. Regime de bens. Separação convencional

Relator: Ricardo Villas Bôas Cueva

(...) "1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002 confere ao cônjuge casado sob a égide do regime de separação convencional a condição de herdeiro necessário, que concorre com os descendentes do falecido independentemente do período de duração do casamento, com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário para uma sobrevivência digna. 2. O intuito de plena comunhão de vida entre os cônjuges (art. 1.511 do Código Civil) conduziu o legislador a incluir o cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários (art. 1.845), o que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo sucessório, à luz do princípio da vedação ao retrocesso social. 3. O pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento pátrio previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial." (...)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.472.945 - RJ (2013/0335003-3)

RELATOR    : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE    : A. D. P. ADVOGADOS    : EDUARDO AUGUSTO G. N. A. FLÔRENCIO E OUTRO(S) MARIANA DE FIGUEIREDO CORRÊA DA VEIGA E OUTRO(S) MAURICIO DE FIGUEIREDO CORRÊA DA VEIGA E OUTRO(S) TITO VIANA MARTINS FILHO MATHEUS DE FIGUEIREDO CORREA DA VEIGA E OUTRO(S) RICARDO CUNHA FIGUEIREDO RECORRIDO    : S. J. W. ADVOGADOS    : RAFAEL JOSÉ DA COSTA GUILHERME NITZSCHE WILLEMSENS E OUTRO(S) JOÃO ALBERTO WHEHAIBE JÚNIOR EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO E PARTILHA. REGIME DE BENS. SEPARAÇÃO CONVENCIONAL. PACTO ANTENUPCIAL POR ESCRITURA PÚBLICA. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. CONCORRÊNCIA NA SUCESSÃO HEREDITÁRIA COM DESCENDENTES. CONDIÇÃO DE HERDEIRO. RECONHECIMENTO. EXEGESE DO ART. 1.829, I, DO CC/02. AVANÇO NO CAMPO SUCESSÓRIO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL. 1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002 confere ao cônjuge casado sob a égide do regime de separação convencional a condição de herdeiro necessário, que concorre com os descendentes do falecido independentemente do período de duração do casamento, com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário para uma sobrevivência digna. 2. O intuito de plena comunhão de vida entre os cônjuges (art. 1.511 do Código Civil) conduziu o legislador a incluir o cônjuge sobrevivente no rol dos herdeiros necessários (art. 1.845), o que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo sucessório, à luz do princípio da vedação ao retrocesso social. 3. O pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento pátrio previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial. 4. O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e não, como cediço no direito de família, a vida em comum. As situações, porquanto distintas, não comportam tratamento homogêneo, à luz do princípio da especificidade, motivo pelo qual a intransmissibilidade patrimonial não se perpetua post mortem . 5. O concurso hereditário na separação convencional impõe-se como norma de ordem pública, sendo nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque o referido regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência posta no art. 1.829, I, do Código Civil. 6. O regime da separação convencional de bens escolhido livremente pelos nubentes à luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de forma cogente pela legislação (art. 1.641 do Código Civil), e no qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente. 7. Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o intérprete restringir onde a lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma da separação dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal de 1988). 8. O novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda que os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo patrimônio é, inexoravelmente, composto somente por acervo particular. 9. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, decide a Terceira Turma, por maioria, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votou vencido o Sr. Ministro Moura Ribeiro. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 23 de outubro de 2014(Data do Julgamento)

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.472.945 - RJ (2013/0335003-3)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial, interposto com fulcro nas alíneas "a" e "c" do artigo 105, inciso III, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro assim ementado: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO DAS SUCESSÕES. VIÚVA. SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE HERDEIRA NECESSÁRIA, POR IMPOSIÇÃO DO ART. 1829, I, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE SE CONSIDERAR A SEPARAÇÃO CONVENCIONAL COMO ESPÉCIE DO GÊNERO SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA , ANTE O FLAGRANTE ANTAGONISMO ENTRE OS TERMOS 'CONVENÇÃO' E 'OBRIGAÇÃO'. NORMA EXCEPCIONAL QUE, PORTANTO, NÃO COMPORTA INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA , SOB PENA DE VIOLAÇÃO À SEGURANÇA JURÍDICA. PRECEDENTE DA 3ª TURMA DO STJ (REsp 992-749/MS) QUE, NÃO POSSUI CARÁTER VINCULANTE, TAMPOUCO TEVE O CONDÃO DE PACIFICAR A MATÉRIA ATINENTE À REGULAMENTAÇÃO DA SUCESSÃO PELO CÓDIGO CIVIL DE 2002. CASAMENTO    DURADOURO    (MAIS    DE        25    ANOS),    SITUAÇÃO    FÁTICA DIAMETRALMENTE OPOSTA ÀQUELA DO JULGAMENTO DO EGRÉGIO STJ, ONDE SE APRECIOU UNIÃO COM DURAÇÃO DE APENAS 10 MESES. RELEVANTE    CRÍTICA    DOUTRINÁRIA    AO    PRECEDENTE    DA    CORTE SUPERIOR , GUARDADA A DEVIDA VÊNIA (CARLOS ROBERTO GONÇALVES - DIREITO CIVIL BRASILEIRO, VOLUME 7). SUCESSÃO LEGÍTIMA QUE, COMO INDICA A PRÓPRIA DENOMINAÇÃO, SEGUE A ORDEM LEGAL . PROTEÇÃO DO NOVO CÓDIGO AO CÔNJUGE, HERDEIRO NECESSÁRIO DA PARTE DO PATRIMÔNIO NÃO ALCANÇADA POR MEAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO, CONFIRMANDO-SE A DECISÃO DE RECONHECIMENTO DA VIÚVA COMO HERDEIRA NECESSÁRIA" (e-STJ fls.195-196 - grifou-se).

Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento interposto por A. D. P., única filha de Paulo Roberto Vilela Pereira, falecido em 28.12.2011 (e-STJ fl. 31), contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Volta Redonda/RJ (e-STJ fls. 117-119), nos autos da ação de inventário nº 0001930-30.2012.8.19.0066 que admitiu a viúva S. J. W., casada com o autor da herança desde 11.2.1984, sob o regime de separação convencional (e-STJ fl. 32), como sua herdeira necessária, motivo pelo qual a cônjuge supérstite foi nomeada inventariante nos autos principais.

Noticiam os autos que a inventariante ficou casada com o de cujus por 27 (vinte e sete) anos.

A remoção da cônjuge sobrevivente do referido