Relator: Rui Portanova
Tema(s): União estável putativa Partilha de bens
Tribunal TJRS
Data: 10/12/2014
RP
Nº 70060165057 (Nº CNJ: 0209068-92.2014.8.21.7000)
2014/Cível
APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA. Partilha de bens. majoração de alimentos.
APELAÇÃO AUTORA
Reconhecimento da união
A confissão da apelante de que ficou sabendo somente “no processo” que o apelado estava em processo de separação com a esposa do Tocantins, as idas e vindas do réu, a distância entre os estados da federação e o processo de separação do casamento; corroboram a tese de que a apelante não sabia que o réu era casado, vivendo uma “união estável putativa”, a qual, em analogia ao “casamento putativo”, deve receber as consequencias jurídicas similares às da união estável.
Precedentes jurisprudenciais.
Partilha de bens.
Não vindo prova da propriedade imobiliária adquirida no curso da união, viável a partilha somente dos direitos decorrentes de contrato particular de compra e venda de imóvel.
Parcialmente provido o recurso no ponto.
Alimentos à filha do casal
O valor dos alimentos em dois salários mínimos é adequado, pois não se sabe exatamente qual é a possibilidade econômica do alimentante, bem como se trata de valor razoável, em face das necessidades normais de uma menina de 10 anos.
Desprovido no ponto.
APELAÇÃO RÉU – Alimentos
Considerando que o Apelante pagou à Alimentanda o valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos desde que foram fixados provisoriamente nos autos, e os sinais da sua riqueza apontam ter condições de suportar tal importância, não há razão para reduzir o valor arbitrado na sentença.
Logo, deve ser confirmada a sentença relativamente à pensão alimentícia de 02 salários mínimos.
DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO DO RÉU.
Apelação Cível
Oitava Câmara Cível
Nº 70060165057 (Nº CNJ: 0209068-92.2014.8.21.7000)
Comarca de Porto Alegre
M.M.V.Z.
..
APELANTE/APELADO
K.M.V.L.
..
APELANTE/APELADO
M.L.L.
..
APELANTE/APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento à apelação da autora e negar provimento à apelação do réu.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Luiz Felipe Brasil Santos e Des. Alzir Felippe Schmitz.
Porto Alegre, 30 de outubro de 2014.
DES. RUI PORTANOVA,
Relator.
portanova@tj.rs.gov.br
RELATÓRIO
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Ação de dissolução de união estável cumulada com partilha de bens, alimentos e regulamentação de visitas, ajuizada por MANOELA, por si e representando sua filha KAILANY, contra MARCELO.
Ao final, a sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para: a) declarar que não houve união estável entre as partes, também não existindo bens a partilhar; b) conceder a guarda da filha à autora; c) fixar visitas do pai à filha das 10h de sábado até 20h de domingo, bem como regulamentar a visitação nas datas comemorativas; d) fixar alimentos em favor da filha Kailany no valor de 02 (dois) salários mínimos.
Contra essa sentença, ambas as partes apelaram.
O primeiro apelo é das autoras MANOELA e KAILANY. Em suma, sustentaram que há prova suficiente da união estável. Defenderam que MANOELA e MARCELO não viveram um simples namoro, mas uma relação com objetivo de constituição de família, tanto é assim que geraram prole. Aduziram ser cabível a partilha do único bem adquirido durante a constância da união, consubstanciado no imóvel no qual residiam as partes. Também se insurgiram contra o valor dos alimentos em favor da filha e pediram majoração. Por fim, sustentaram que deve ser redimensionanda a sucumbência, pois decaíram de 40% de seus pedidos. Pediram a reforma da sentença nos pontos destacados.
Já o réu MARCELO apelou em relação ao valor dos alimentos em 02 salários mínimos. Disse ser valor acima das suas possibilidades requereu a minoração para 01 salário mínimo. Também pediu a redução dos honorários sucumbenciais.
Foram apresentadas contrarrazões pelas autoras. Preliminarmente, pediram o não conhecimento da apelação do réu, pela falta de pagamento do preparo.
Nesse grau de jurisdição, o Ministério Público opinou pela inadmissibilidade da apelação do réu, em decorrência da deserção (falta do preparo). Tocante ao apelo das autoras, opinou pelo desprovimento.
Foi indeferido o pedido de gratuidade judiciária, feito na apelação do réu, momento em que foi determinada a intimação para pagamento do preparo (fl. 829).
O apelante MARCELO pagou o preparo e pediu o seguimento do recurso de apelação.
Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552, do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.
VOTOS
Des. Rui Portanova (RELATOR)
Preliminar – deserção apelação do réu
A preliminar de deserção da apelação do réu está prejudicada.
Com efeito, analisado e indeferido o pedido de gratuidade judiciária feita no apelo, o apelante pagou as custas do recurso (guia de fl. 834), restando atendido o pressuposto extrínseco da comprovação preparo recursal.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
A parte autora se insurge contra 1. o não reconhecimento da união estável; 2. a improcedência da partilha do apartamento da Rua Alberto Silva, 44, apto 313, Edifício Morada dos Passos, bloco c, 3. o valor dos alimentos em favor da filha do casal e 4. a distribuição da sucumbência para pagamento das custas e dos honorários.
1. UNIÃO ESTÁVEL
A apelante alega que viveu em união estável com o réu MARCELO, no período de 2003 até junho de 2009, sendo fruto desse relacionamento a também apelante KAILANY, nascida em 27/01/2004.
Sustenta que o relacionamento apresentou as características da publicidade, continuidade, durabilidade a ânimo de família (artigo 1.723 do Código Civil), tendo o casal residido no apartamento adquirido somente em nome do réu, objeto do pedido de partilha.
Destacou que o réu era viajante e também tinha domicílio no Tocantins, estando separado de fato da esposa do casamento no Estado de Tocantins.
Desconstituída uma primeira sentença, em razão de cerceamento de defesa (acórdão nº 70047458617 – fl. 431), foram remetidas cópias do processo de separação e divórcio entre o réu MARCELO e a esposa do casamento Maria Sônia (fls. 486/670 – provenientes da Comarca de Itacajá/TO).
Após a reabertura da fase instrutória, com o aporte dos documentos da ação de separação, a sentença julgou improcedente o pedido de reconhecimento da união, pois ocorrida paralelamente ao casamento do réu com Maria Sônia.
Vale ilustrar essa assertiva com o seguinte trecho da sentença (fl. 790):
“Além disso, cabe ressaltar que conforme documentos acostados às fls. 486/670, advindos da Comarca de Itacajá/TO, referente ao processo judicial do processo de separação do réu, objeto do agravo retido da parte autora, julgado pelo tribunal ad quem, dão conta de que não poderia haver reconhecimento da união estável neste feito.
É claro ao analisar o processo referido acima, que Marcelo manteve relacionamento concomitante entre a parte autora e sua anterior esposa.
Os boletins de ocorrência às fls. 505/507, revelam que Marcelo estava ainda casado no período de 2007/2008, com rompimento de meses, retomado o relacionamento com Maria Sonia (fl. 507); fato que indica a concomitância de relacionamentos.
Também, analisando a petição inicial do processo de separação que tramitou no Tocantins (fls. 487/500), verifica-se que as partes viveram juntas durante muitos anos (1991 até 2009), ainda que aos trancos e barrancos, nos últimos anos de união, conforme relatado nos boletins de ocorrência . Na petição, firmada em dezembro de 2009, consta pedido de afastamento do varão do lar, corroborando com a assertiva de que ainda Marcelo coabitava com Maria Sonia.
Não menos importante, foram as alegações trazidas pela separanda, que afirmou diversas vezes que Marcelo tinha uma amante em Porto Alegre.
Desta forma, confrontando os períodos de convivência, impossível que Marcelo tenha união estável com Manoela de 2003 até meados de 2009, pois ainda era casado.
Cabe aclarar que o ordenamento jurídico vigente não reconhece relações mantidas paralelamente ao casamento, motivo pelo qual, incabível o reconhecimento da união estável entre as partes .” (destaque não original)
Como visto, a sentença deixou de reconhecer a união estável da apelante, em razão da concomitância com o casamento do réu no Tocantins.
Não fosse a concomitância de relacionamentos, teríamos aqui prova suficiente para o reconhecimento da união estável.
Veja-se que as provas caracterizadoras da união estável, de algum modo, foram verificadas na própria sentença (fl. 785):
“A testemunha Therezinha, afirmou que conhecia o casal como marido e mulher . Contudo, referiu que Manoela sabia que o demandado era casado e que ele sempre dizia que ia se separar da mulher. Ainda, disse que sabia que a mulher dele morava em Tocantins, e dele passar tempos com a esposa, vindo residir alguns períodos com a autora.
Ademais, a testemunha Clarice (fl. 319v), afirmou que achava que ele era viajante, pelo fato de nem sempre estar em casa.
Do mesmo modo, em que pese as fotos juntadas às fls. 43/68, as quais reconheceu o demandado como sendo em Santa Catarina e Goiânia, a publicidade do relacionamento restou precária. O fato de estarem juntos, demonstra que sempre que o demandado vinha para ver a filha, passava momentos com a mãe da menina, o que é perfeitamente normal.
Outrossim, pernoitar na casa onde vivia a filha e a mãe desta, não constitui prova cabal da residência sob o mesmo teto e da intenção de constituir família . Sequer há contas rotineiras (água, luz ou telefone) no nome da autora em qualquer dos endereços que morou.”
“Data venia”, o fato do réu ter adquirido um imóvel, ter colocado a mãe da sua filha e a filha para residir neste imóvel, pagar as contas do imóvel e ainda “pernoitar” no imóvel, quando em suas estadas em Porto Alegre, é demonstrativo claro da intenção de manter família.
Da mesma forma as fotos de fls. 43/68, ao contrário do que avaliado na sentença, demonstram a publicidade da relação e o ânimo de constituição de família, estando ali retratados momentos de convivência familiar e comunitária do casal, em viagens e festejos diversos com terceiras pessoas e, ainda, a convivência da apelante com outros filhos do réu, como reconhecido na própria sentença.
Pois bem.
Analisado o caso, penso que a questão não passa pelo exame da possibilidade ou impossibilidade jurídica de reconhecimento de união dúplice, tal como feito na sentença.
Veja-se que a própria sentença reconheceu que o réu e sua esposa do casamento, no Estado do Tocantins, viviam “aos trancos e barrancos, nos últimos anos de união, conforme relatado nos boletins de ocorrência”.
Ficou também demonstrado que o réu alternava períodos em Tocatins - onde seu casamento já estava deteriorado – com períodos aqui em Porto Alegre, convivendo com a apelante como se casado fosse.
Nesse contexto, não verifico da prova que a autora tivesse conhecimento da existência do casamento do réu no Estado do Tocatins.
Considerando o fato de que o casamento estava em vias de acabar, como de fato acabou, não é difícil imaginar, seja em face da distância entre os diferentes estados da Federação, seja porque o casamento estava rumando para o fim, que a apelante não sabia que o apelado era casado.
Tal conclusão é obtida a partir do depoimento da apelante a partir da fl. 300:
“J: Quando a senhora começou a namorar ele, ele disse se era solteiro, casado, separado?
A: Ele não disse nada.
J: E a senhora não perguntou?
A: Não perguntei, acredito que uma pessoa começa a se envolver com outra, e com filho, e ele assumiu, então era algo inquestionável, não precisava nem perguntar, no meu ponto de vista. Aí nós fomos...
(...)
J: Qual era a atividade dele?
A: Ele era representante comercial, até por que ele era dono de um dos postos da Iriel, ele trabalhava com o pai. Como o pai (inaudível) empresa, ele parou de trabalhar com isso. Como ele sempre disse que tinha negócio em Tocantins, ele disse que ia em Tocantins trabalhar e trouxe com ele. Nessas questões.
J: De quanto em quanto tempo ele ia para Tocantins?
A: Depende, às vezes ele ficava 06 meses, às vezes ele ficava 03 meses. Em Tocantins, e voltava para casa. Com relação ao tempo que ele ficava.
J: O máximo foi 06 meses?
A: Máximo foram 06 meses.
J: E o mínimo 03 meses?
A: Não, o mínimo 01 ou 02 meses.
J: E quando ele ficava 06 lá, como eram pagas as contas da casa, as suas despesas?
A: Ele mandava para o banco, mandava a dedução do boleto, ele pagava, ele tinha o cartão de crédito junto. Quando vê pagava.
J: A senhora, o dinheiro para o diaadia?
A: Mandava para a conta.
J: Vocês tinham conta conjunta?
A: Não, tínhamos cartão de crédito conjunto.
J: E a senhora tinha uma conta e ele ia depositar dinheiro nessa conta?
A: Na verdade conta da minha filha, porque nós abrimos para ela.
J: Ah! É a conta da sua filha?
A: Isso.
J: E movimentava dinheiro ali?
A: É.
(...)
J: E ele disse o que ele fazia lá em Tocantins?
A: Ele disse que tinha uma fazenda, uma livraria, que ele tinha coisas assim.
J: A senhora nunca foi com ele para lá?
A: Não.
J: Os filhos nunca comentaram com a senhora se ele tinha tido esposa ou outra companheira, alguma coisa assim?
A: Nesse momento não. Fiquei dois meses com a filha dele... Ela estava morando no Cassino, eu fiquei dois meses com ela lá, só que a minha filha era pequena, porque ela tem duas gêmeas, elas três estavam juntas. Naquela convivência, até então nunca falaram nada a respeito.
(...)
J: Vocês viajavam muito no tempo em que viveram juntos?
A: Eu nem cheguei a ir para a Bahia porque eu me separei antes, mas para Foz do Iguaçu, nós fomos três vezes para Foz do Iguaçu com certeza, Goiânia, nós estivemos uma vez em Brasília, nós viajamos bastante. Na praia, todo o verão, com certeza estávamos lá.
J: Aqui tem uns e-mails juntados, que ele disse que estava tentando vender umas propriedades, alguma coisa assim?
A: Eu acredito que seja de Tocantins, porque (inaudível) e fiquei um mês sem o que fazer, tão importante para me sustentar. Então, infelizmente (inaudível).
J: Sem mais perguntas, dada a palavra ao procurador do requerido.
PR: Se ela tem conhecimento se em algum período da vivencia, que ele era casado com a senhora Maria Sônia, e ela residia em Tocantins?
A: Eu e (inaudível), eu fiquei sabendo uma ora no processo que eles estavam em separação, porque ele sempre me disse que teve uma mulher, que foi mãe dos filhos dele, e que tinha outra que tinha se separado. (inaudível) e saiu do outro também nunca entrei com...”
Com efeito, a confissão da apelante de que ficou sabendo somente “no processo” que o apelado estava em processo de separação com a esposa do Tocantins, as idas e vindas do réu, a distância e o processo de separação do casamento, corroboram a tese de que a apelante não sabia do casamento, vivendo uma “união estável putativa”, a qual, em analogia ao “casamento putativo”, deve receber as consequencias jurídicas similares às da união estável.
Esse é o entendimento recente da Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. CASAMENTO. SEPARAÇÃO FÁTICA. BOA FÉ. UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA. 1. A apelada alegou ter vivido em união estável com o falecido por cerca de 19 anos, residindo com ela sob o mesmo teto em São Gabriel, e com ele teve duas filhas. De outro lado, as apelantes sustentam que ele se manteve casado até o óbito, mantendo residência com a esposa em Passo Fundo. 2. Não ficou cabalmente demonstrado que, não obstante a vida profissional, social e familiar que o de cujus tinha em São Gabriel, ele tivesse mantido hígido e sem qualquer ruptura fática seu casamento. A prova por vezes se mostra dúbia e insuficiente, corroborando uma e outra das teses alegadas. 3. E, ainda que assim não fosse, diversamente do que sustentam as apelantes, o caso admite o reconhecimento da união estável putativa, autorizando que, excepcionalmente, à semelhança do casamento putativo, se admita a produção de efeitos à relação fática, pois a autora foi tomar conhecimento da condição de casado do falecido quando a segundo filha já contava 09 anos de idade, evidenciando sua boa-fé. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70060286556, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 25/09/2014)
UNIÃO ESTÁVEL. SITUAÇÃO PUTATIVA. AFFECTIO MARITALIS. NOTORIEDADE E PUBLICIDADE DO RELACIONAMENTO. BOA-FÉ DA COMPANHEIRA. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. PARTILHA DE BENS. PROVA. ALIMENTOS. FILHA MENOR. ADEQUAÇÃO DO QUANTUM. REDUÇÃO. DESCABIMENTO. 1. Tendo o relacionamento entretido entre os litigantes assemelhado-se a um casamento de fato, com coabitação, clara comunhão de vida e de interesses, resta induvidosa a affectio maritalis. 2. Comprovada a notoriedade e a publicidade do relacionamento amoroso havido entre a autora e o réu, mas que ele mantinha união estável concomitante com outra mulher em outra cidade, é cabível o reconhecimento de união estável putativa, quando fica demonstrado que ela não sabia do relacionamento paralelo do varão com a outra mulher. 3. Comprovada a união estável, devem ser partilhados de forma igualitária todos os bens adquiridos a título oneroso com a autora na constância da vida em comum, pouco importando qual tenha sido a colaboração prestada individualmente pelos conviventes. Inteligência do art. 1.725 do CCB. 4. Inviável a partilha da Camioneta S10, por não haver nos autos elementos suficientes acerca da sua existência e propriedade. 5. Salvo prova em contrário, presume-se que os móveis que guarneciam a residência que mantinha com a autora tenham sido adquiridos na constância da união estável. Inteligência do art. 1662 do CCB. 6. Os alimentos devem ser fixados de forma a atender as necessidades da filha, mas dentro da capacidade econômica do genitor e sem sobrecarregá-lo em demasia. 7. O encargo de prover o sustento da prole comum é de ambos os genitores, devendo cada um concorrer na medida da própria disponibilidade. 8. Tratando-se de alimentos destinados para o sustento de uma única filha, justifica-se a manutenção do valor fixado, pois está dentro da razoabilidade e adequado ao binômio legal, bem como ao critério de fixação usual na jurisdição de família. 9. Se o réu alegou que não pode pagar os alimentos, cabia a ele demonstrar a sua impossibilidade e comprovar a sua real capacidade econômica. Conclusão nº 37 do CETJRS. Recurso parcialmente provido. (Apelação Cível Nº 70059170282, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 07/05/2014)
APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. RELACIONAMENTO PARALELO AO CASAMENTO. UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA. RECONHECIMENTO. EXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE O RELACIONAMENTO TEVE COMO OBJETIVO A CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIA. ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL. INEXISTÊNCIA DE BENS A PARTILHAR. FIXAÇÃO DE ALIMENTOS EM FAVOR DA CONVIVENTE. DESCABIMENTO, NO CASO. PREQUESTIONAMENTO. 1. As provas colhidas na instrução processual revelam que as partes mantiveram união estável putativa, no período de setembro de 1998 a setembro de 2010. Reforma da sentença, no ponto. 2. No entanto, inexistem bens passíveis de partilha. 3. Tratando-se de pessoa saudável e que exerce atividade remunerada própria, não faz jus a ex-convivente a alimentos. 4. O magistrado não está obrigado a se manifestar sobre todos os dispositivos legais invocados pelas partes, necessitando, apenas, indicar o suporte jurídico no qual embasa seu juízo de valor, entendendo ter dado à matéria a correta interpretação jurídica. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70049106578, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 13/09/2012)
Assim, resta demonstrada a viabilidade de reconhecimento da união estável putativa da apelante, uma vez presentes os pressupostos da segunda união, previstos no art. 1.723 do CC.
Razão pela qual, em face das provas acerca da existência da união, já destacadas no tópico anterior, dou provimento à apelação no ponto, para reconhecer a união estável entre a apelante MANOELA e o apelado MARCELO, no período de 2003 até junho de 2009.
2. EFEITOS – PARTILHA DE BENS.
A apelante arrolou como único bem a partilhar, o apartamento da Rua Alberto Silva, 44, apto 313, Edifício Morada dos Passos, bloco c; o qual a apelante residia no início da demanda, segundo a qualificação da petição inicial (fl. 02).
Reconhecida a união, os bens onerosamente adquiridos no curso da relação devem ser partilhados, nos termos do artigo 1.725 do Código Civil.
Dito isso, vale termos em conta o que disse a sentença em relação a esse apartamento (fl. 792):
“No tocante à partilha dos bens, informou a autora que adquiriram um imóvel (apartamento na rua Alberto Silva, 44 ap 313, Edifício Morada dos Passos, bloco c).
O pedido quanto à partilha resta prejudicado, pois sem o reconhecimento da união entre o casal não há partilha de bens.
Além disso, o imóvel nunca esteve em nome do demandado, e como se observa às fls. 349/350, o contrato foi rescindido.” (destaque não original)
O destaque feito na sentença, no sentido de que o imóvel nunca esteve em nome do demandado, procede.
Na fl. 23, a apelante trouxe um “contrato particular de compra e venda” deste apartamento onde somente o apelado MARCELO aparece como “compromissário comprador” e a senhora Claudiane C. S. (que não é parte deste processo), consta como “compromitente vendedora”.
Vale destacar que, tanto o imóvel não é de titularidade do apelado, que sequer na sentença homologatória do acordo de partilha de bens do casamento no Tocantins (ata de audiência de fl. 662), este apartamento foi arrolado na partilha do casamento.
Por outro lado, os documentos de fl. 349/350, referidos na sentença, dão conta de um acordo feito em ação de execução da vendedora Claudiane e o apelado MARCELO, onde ficou ajustada a rescisão do contrato particular de venda de fl. 23.
A apelante agora refere – no tópico em que pede a partilha do apartamento – que o ex-companheiro MARCELO passou a ter um caso amoroso com a proprietária do apartamento Claudiane e realizaram aquele acordo de fl. 349 para frustrar o direito de partilha da apelante.
Pois bem.
Primeiro, a apelante não trouxe realmente prova de aquisição imobiliária do bem imóvel no curso da união.
A prova de titularidade imobiliária se faz com o registro na matrícula do imóvel e o contrato particular de compra e venda de fl. 23 não substitui tal prova.
Por segundo, as alegações feitas agora no apelo, em relação ao envolvimento amoroso entre Marcelo e a vendedora Claudiane, sequer podem ser objeto de debate neste processo, pois Claudiane não é parte nesta demanda.
Contudo, o contrato de fl. 23, onde claramente consta a aquisição de direitos tendentes à aquisição imobiliária, tem valor jurídico e deve ser objeto de partilha, pois os direitos daquele instrumento foram contratados no curso do regime de bens da união estável.
Portanto, o apelo vai parcialmente provido no ponto para deferir a partilha dos direitos do contrato particular de compra e venda de fl. 23, devendo a apelante buscar em ação própria os direitos que entender cabíveis, com a citação de todos os interessados.
Deferida a partilha dos direitos do contrato de compra e venda.
3. ALIMENTOS DA FILHA
A sentença confirmou a decisão liminar que fixou alimentos provisórios em favor da filha e apelante KAILANY, em 02 (dois) salários mínimos.
Agora no apelo é defendido que as necessidades da filha aumentaram, pois, na época da fixação dos alimentos, ela tinha 06 anos de idade e atualmente possui 10 anos de idade.
Requerem a majoração dos alimentos, sem indicar o valor pretendido.
No ponto, estou em que o valor dos alimentos em dois salários mínimos é adequado, pois não se sabe exatamente qual é a possibilidade econômica do alimentante, bem como se trata de valor razoável em face das necessidades normais de uma menina de 10 anos.
Sendo assim, para evitar tautologia, adoto como razões de decidir o parecer da lavra do ilustre Procurador de Justiça Alceu Schoeller de Moraes (fl. 827):
“Dos alimentos
Propugnam as Apelantes pela majoração da verba alimentar enquanto o Apelante requer a minoração para o equivalente a 01 salário mínimo nacional.
Gize-se que a obrigação alimentar é inerente ao poder familiar e é dever do genitor empreender esforços a honrá-la, no sustento da filha em formação.
De acordo com o artigo 1.694, § 1º, do Código Civil, “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”.
A filha do Apelante nasceu em 27/01/2004 (fl. 22), contando, atualmente, com 10 anos de idade, por isso suas necessidades são presumidas.
No curso do processo foram arbitrados alimentos provisórios no valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos nacionais, em 19/01/2010 (fl. 143), já que ausente comprovação das possibilidades do Alimentante, na ocasião.
Contra referida decisão foi interposto agravo de instrumento pelo alimentante, não conhecido (Agravo de Instrumento n.º 70035341197) – fls. 170/171. Em seu depoimento pessoal (fls. 305-v/315) disse que era autônomo, percebendo comissões. Declarou também que era proprietário de uma livraria no estado de Tocantins (fl. 311-v).
As declarações de imposto de renda do Apelante, relativas aos anos-calendários 2008/2207, demonstram rendimentos anuais de R$ 19.000,00 e R$ 15.200,00 (fls. 323/334).
Não há outro documento acostado nos autos a demonstrar os exatos ganhos do Apelante.
Assim, considerando que o Apelante pagou à Alimentanda o valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos desde que foram fixados provisoriamente nos autos, e os sinais da sua riqueza apontam ter condições de suportar tal importância, não há razão para reduzir o valor arbitrado na sentença.
Logo, deve ser confirmada a sentença relativamente à pensão alimentícia de 02 salários mínimos.”
Desprovido o apelo no ponto.
4. SUCUMBÊNCIA
Em face do provimento do apelo, em que se reconheceu a existência da união e a partilha dos direitos do contrato de compra venda, somada à procedência dos pedidos de guarda e visitação, já deferidos na sentença; tenho que a parte autora/apelante decaiu de parte mínima do pedido, devendo o réu arcar integralmente com as custas processuais e os honorários advocatícios fixados na sentença (artigo 21, parágrafo único do CPC).
APELAÇÃO DO RÉU – VALOR DOS ALIMENTOS
MARCELO apelou em relação ao valor dos alimentos em 02 salários mínimos.
Disse ser valor acima das suas possibilidades e que a genitora também tem dever de sustentar a filha. Argumentou que o valor dos alimentos em 02 salários pode estimular a genitora da filha ao ócio.
Requereu a minoração para 01 salário mínimo. Também pediu a redução dos honorários sucumbenciais.
Contudo, vai mantido o valor dos honorários fixados na sentença.
É que na partilha do divórcio do apelante, realizado no Estado de Tocantins, o apelante ficou com 70% do produto da venda de uma Fazenda, cujo valor da alienação extrajudicial não pode ser inferior a R$ 662.000,00 (acordo de fl. 663).
Na fl. 505, consta um boletim de ocorrência, feito pelo apelante, relatando danos praticados contra seu veículo “Nissan Frontier”, veículo de valor acima da média dos carros populares, como se sabe.
Informação que pode ser considerada um sinal exterior de riqueza.
Ao depois, a declaração de bens no inventário do pai do apelante (fl.745/747), dá conta que o recorrente é herdeiro em inventário cuja avaliação dos bens supera os 06 milhões de reais.
Logo, o apelante não demonstra falta de possibilidade econômica de pensionar a filha no valor fixado na sentença de 02 salários mínimos.
Por outro lado, as necessidades da filha, que possui 10 anos de idade (fl. 05), são presumidas, não existindo mínimo indício de que os alimentos servirão ao estímulo ao ócio da genitora.
No mesmo sentido, é o parecer do Ministério Público neste grau de jurisdição, que ora adoto como razões complementares de decidir (fl. 827):
“A filha do Apelante nasceu em 27/01/2004 (fl. 22), contando, atualmente, com 10 anos de idade, por isso suas necessidades são presumidas.
No curso do processo foram arbitrados alimentos provisórios no valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos nacionais, em 19/01/2010 (fl. 143), já que ausente comprovação das possibilidades do Alimentante, na ocasião.
Contra referida decisão foi interposto agravo de instrumento pelo alimentante, não conhecido (Agravo de Instrumento n.º 70035341197) – fls. 170/171. Em seu depoimento pessoal (fls. 305-v/315) disse que era autônomo, percebendo comissões. Declarou também que era proprietário de uma livraria no estado de Tocantins (fl. 311-v).
As declarações de imposto de renda do Apelante, relativas aos anos-calendários 2008/2207, demonstram rendimentos anuais de R$ 19.000,00 e R$ 15.200,00 (fls. 323/334).
Não há outro documento acostado nos autos a demonstrar os exatos ganhos do Apelante.
Assim, considerando que o Apelante pagou à Alimentanda o valor equivalente a 02 (dois) salários mínimos desde que foram fixados provisoriamente nos autos, e os sinais da sua riqueza apontam ter condições de suportar tal importância, não há razão para reduzir o valor arbitrado na sentença.
Logo, deve ser confirmada a sentença relativamente à pensão alimentícia de 02 salários mínimos.”
Sucumbência
O pedido de alteração na distribuição de sucumbência vai desprovido, em decorrência da alteração da sucumbência, já realizada em decorrência do julgamento do apelo da autora.
ANTE O EXPOSTO,
1. dou parcial provimento ao apelo da parte autora para:
- reconhecer a união estável putativa entre a apelante MANOELA e o apelado MARCELO, no período de 2003 até junho de 2009 e
- deferir a partilha dos direitos do contrato particular de compra e venda de fl. 23 e
- determinar que o réu pague integralmente com as custas processuais e os honorários advocatícios fixados na sentença e
2. nego provimento à apelação do réu.
Des. Luiz Felipe Brasil Santos (REVISOR) - De acordo com o (a) Relator (a).
Des. Alzir Felippe Schmitz - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. RUI PORTANOVA - Presidente - Apelação Cível nº 70060165057, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DO RÉU. UNÂNIME."
Julgador (a) de 1º Grau: KATYA ZIEDE COELHO LEAL
Disponível na Jurisprudência do IBDFAM, do Dia 10 de Dezembro de 2014